Revelação, uma composição de Clodo e Clésio, tornou-se nacionalmente conhecida na voz de Fagner.
Uma música com letra curta, mas muito forte, que revela um sentimento tido como morto, que o eu-lírico tenta a todo custo mantê-lo guiardado, escondido, mas que num dia vestido, de saudade viva, o sentimento ilhado volta a aparecer.

O que poucos sabem é que a música já teve outras letras, até chegar na versão final.
Quem conta é Clodo, que compôs a música junto com Clésio (eles formavam um trio, Clodo, Climério e Clésio). A história é contada no livro Então foi assim, de Ruy Godinho:
‘’ Essa melodia é do Clésio. E ele me disse que tinha feito para o poema de uma moça, mas por algum motivo não explicado, ele não continuou com o poema. Eu não conhecia o poema original e sabia da história vagamente. De repente o Clésio apareceu cantando a música – numa coincidência inacreditável – em cima de um poema de Drummond que fala: ‘As coisas tangíveis tornam-se insensíveis à palma da mão, mas as coisas findas, muito mais que lindas, essas ficarão.” Clodo refere-se a poema Memória, de Carlos Drummond de Andrade:
Drummond
Amar o perdido
deixa confundido
este coração.
Nada pode o olvido
contra o sem sentido
apelo do Não.
As coisas tangíveis
tornam-se insensíveis
à palma da mão.
Mas as coisas findas,
muito mais que lindas,
essas ficarão.
Esse poema é do tamanho da música Revelação sem tirar nem botar uma sílaba. Você pode cantá-lo inteirinho com a melodia do Clésio”, sugere Clodo. Atendi à sugestão do Clodo, cantei e bateu certinho. “ Aí ele chegou e disse: ‘Clodo, esse poema de Drummond é exatamente do tamanho da música’. Aí passamos a cantá-la com a letra de Drummond. Cantamos um ano, talvez. Chegamos a cantar em palco e as pessoas achavam bonita. Mas um dia o Clésio chegou para mim e disse: ‘Clodo, eu soube que alguém já musicou esse poema. De novo a minha música está sem letra’ “, relembra. Clésio tinha razão. Memória fora musicado por Alcyvando Luz e Carlos Coqueijo.
“Aí Clésio resolveu: Vou querer outra letra pra minha música’. Como eu era íntimo dela, sabia o poema, fiz outra letra com a mesma métrica, que hoje eu vejo que dialoga, de alguma forma, com a de Drummond. Ele fala que “as coisas findas, ficarão”. E eu falo que elas voltarão a incomodar. Eu procurei fazer uma letra trabalhando esse tipo de assunto”, justifica Clodo.
Melodia criada, letra devidamente trocada, perguntei ao Clodo como foi que a música foi parar nas mãos de Fagner, aliás, na voz. “O mais interessante é que quando a gente gravou o São Piauí, o nosso primeiro disco, esta música já estava feita e por algum motivo nós não a incluímos no L.P. No dia do show de lançamento do disco, eu a cantei. E nesse show Fagner participou como convidado. Ele estava em início de carreira e iria entrar logo depois de mim. Eu cantei e quando voltei aos bastidores ele falou: ‘Eu queria que você guardasse essa música pra mim’.

Na hora eu não entendi direito. Em seguida ele foi pra França e mandou um cartão-postal reafirmando: ‘Guarda aquela música pra mim’. E eu fiquei guardando. Quando ele chegou, gravou e a música arrebentou, foi um sucesso danado”, revela Clodo. Revelação foi lançada por Fagner no LP Eu Canto – Quem Viver Chorará (1978) e ficou entre as músicas mais tocadas nas emissoras de rádio de todo país nos dois anos seguintes.
A letra:
Um dia vestido
De saudade viva
Faz ressuscitar
Casas mal vividas
Camas repartidas
Faz se revelar
Quando a gente tenta
De toda maneira
Dele se guardar
Sentimento ilhado
Morto, amordaçado
Volta a incomodar