Quem teve a oportunidade de ouvir, no show Recanto (2012), Gal Costa cantando Um dia de Domingo, primeiro, no seu próprio tom, para depois, numa imitação de voz e trejeitos, cantar a música como se fosse Tim Maia, não sabe alguns dos episódios divertidos que envolveram a gravação da música.
Segundo Nelson Motta, na biografia que escreveu sobre Tim (Vale Tudo – O Som e a Fúria de Tim Maia), há alguns episódios interessantes:
Um dia de Domingo é uma música composta por Sullivan e Massadas, uma balada romântica que algum ouvido mais exigente poderia até chamar de brega.
Tim gostou imediatamente da música. Gal, nem tanto, mas achou que um bom arranjo e as vozes dela e de Tim poderiam fazer com que o dueto fosse um sucesso.
Gal sugeriu, após a primeira gravação, que a música fosse gravada meio tom acima do inicialmente registrado. Lincoln Olivetti, arranjador e produtor, diante da impossibilidade de juntar novamente a banda, regravou a fita em velocidade um pouquinho mais rápida até o tom desejado por Gal.
Tim queria que sua voz ficasse, na edição final, um pouquinho mais alta que a voz de Gal. Não conseguiu.
Como Tim e Gal viajavam sem parar, foi difícil encontrar uma data para que fosse gravado um clip para o Fantástico.
“No dia marcado, Tim recebeu um telefonema da RCA avisando que a gravação atrasaria dois dias porque o vestido de Gal não tinha ficado pronto”.
Dois dias depois, quando ligaram para dizer a hora em que o carro iria busca-lo, mandou avisar a Gal que não poderia ir. ‘O meu vestido não ficou pronto’, disse. E não foi”.8. Não houve clipe no Fantástico. O encontro entre Tim e Gal foi acontecer no Chacrinha
O Velho Guerreiro tinha uma estratégia infalível para se prevenir dos frequentes furos do cantor. Ligava para a mãe dele. Era a única tática que funcionava.
1976 foi um ano marcante na vida de Gilberto Gil. Durante uma turnê dos Doces Bárbaros a Florianópolis, ele foi flagrado com uma pequena quantidade de maconha, o suficiente para que fosse preso e processado pelo uso da droga.
em 15 de julho de 1976, Gilberto Gil foi condenado a 1 ano de prisão, tendo sua pena substituída por internação no Instituto Psiquiátrico São José, em Florianópolis, que durou 4 dias, depois com a transferência para a Clínica Psiquiátrica Botafogo, no Rio de Janeiro, onde passou mais um mês.
Na clínica, ele compôs uma bela canção, “Sandra”, uma homenagem às mulheres com quem conviveu naquele período, até uma homenagem final à sua esposa na época, Sandra Gadelha.
Gil conta, no seu livro “Todas as Letras” quem era cada uma destas mulheres da canção, até a existência de uma outra “Sandra”, que justifica o título. Nas palavras de Gil:
“Em 94, eu estava dando uma entrevista coletiva em Curitiba, quando uma moça entrou e disse: ‘Não se lembra de mim?’ Eu fiquei olhando, olhando, e ela então gritou: ‘Andréia na estréia!’ E eu: ‘Claro!’ Andréia era a menina que eu tinha conhecido, em 76, na passagem do show dos Doces Bárbaros pela cidade (antes de seguirmos para Florianópolis, onde eu fui preso por porte de maconha e posto em tratamento ambulatorial numa clínica, episódio em que a canção é baseada). Tínhamos ficado juntos na ocasião, e ela que me levou a um armarinho para comprar as fitas com que me enlaçou os cabelos trançados. Desde então nunca mais tínhamos nos reencontrado.”
*
“Todas as meninas mencionadas em Sandra foram personagens daqueles dias que eu vivi entre Curitiba e Florianópolis.
a) Maria Aparecida, Maria Sebastiana e Maria de Lourdes me atenderam no hospício durante o internamento imposto pela justiça enquanto eu aguardava o julgamento. A de Lourdes me falava a toda hora: ‘Você vai fazer uma música pra mim, não vai?’ ‘Vou’.
b) Carmensita: essa – foi interessantíssimo -, logo que eu cheguei, ela veio e me disse, baixinho: ‘Seja bem-vindo’.
c) Lair era uma menina de fora, uma fã que foi lá me visitar.
d) Salete era de lá: ‘Meu café é muito ralo’, me falou. ‘É exatamente como eu gosto, chafé’, respondi.
e) Cíntia: também de Curitiba, como Andréia. Quando passamos pela cidade, me levou ao sítio dela uma tarde; foi quem me deu uma boina rosa com a qual eu compareceria ao julgamento mais adiante, em Florianópolis, e com a qual eu apareço no filme Os Doces Bárbaros.
f) Ana: ficou minha amiga até hoje; de Florianópolis.
g) Dulcina, que era a mais calada, a mais recatada de todas na clínica, a mais mansa – era como uma freira -, foi a única que um dia veio e me deu um beijo na boca.
“Sandra, citada no final da letra, era minha mulher, que preferiu não ir a Florianópolis e com a qual eu associei a ideia do hexagrama da torre, tirado no I Ching, um dos meus livros de cabeceira naquele período: a que tomava conta de tudo; onde eu estivesse, o seu olhar espiritual me acompanharia; seu ente se espraiaria, estendendo-se por todas as mulheres com quem eu convivesse. A ela as mulheres citadas na letra remetiam por representarem o feminino, a minha sustentação naquele momento.
“Mas o que ninguém sabe, e que não se revela de nenhuma maneira na canção – o seu lado oculto -, é que há duas Sandras, a que é mencionada no fim e a do título, que não se refere à Sandra com quem eu era casado, mas a uma menina linda, maravilhosa, também chamada Sandra, que tietava o Caetano em Curitiba, amiga da Andréia – que me tietava.”
Eu admiro a ideia de como a referência à Sandra, quase mística, quase um símbolo, que mesmo longe serve de alicerce e de referência…
Sandra Gilberto Gil Maria Aparecida, porque apareceu na vida
Maria Sebastiana, porque Deus fez tão bonita
Maria de Lourdes
Porque me pediu uma canção pra ela
Carmensita, porque ela sussurou: “Seja bem-vindo”
(No meu ouvido)
Na primeira noite quando nós chegamos no hospício
E Lair, Lair
Porque quis me ver e foi lá no hospício
Salete fez chafé, que é um chá de café que eu gosto
E naquela semana tomar chafé foi um vício
Andréia na estréia
No segundo dia, meus laços de fita
Cintia, porque, embora choque, rosa é cor bonita
E Ana, porque parece uma cigana da ilha
Dulcina, porque
É santa, é uma santa e me beijou na boca
Azul, porque azul é cor, e cor é feminina
Eu sou tão inseguro porque o muro é muito alto
E pra dar o salto
Me amarro na torre no alto da montanha
Ficha técnica da faixa:
voz e violão – Gilberto Gil
baixo – Moacyr Albuquerque
violão de aço – Perinho Santana
flauta – Jorginho
flauta – Celso
bateria – Paulinho Braga
percussão – Djalma
piano – Cidinho
coro – Ronaldo Boys
sax-soprano – Mauro Senise
Fontes: Gilberto Gil. Todas as Letras. Org. Carlos Rennó,
Ary Barroso é um dos personagens míticos da música brasileira. Locutor esportivo, apaixonado pelo flamengo, ele tinha um programa de calouros na Rádio Tupi, em que ele inicialmente entrevistava o candidato. Em seguida, fazia algumas brincadeiras, piadas, sendo célebre a apresentação de Elza Soares, lançada por Ari no seu programa.
Quando o intérprete cantava e desafinava, soava um gongo que desclassificava o calouro. Era comum que alguns, envergonhados, saíssem chorando do auditório.
O humorista José Vasconcelos, no show no qual se consagrou (“Eu sou o espetáculo”) fazia uma imitação de Ary às voltas com um calouro, não esclarecendo se é fato, mito ou piada.
No auditório da Rádio Mayrink Veiga, no Rio, Ary apresentava o programa “Calouros em Desfile”, que, segundo ele, procurava revelar valores para a música nacional.
Conta o episódio que num certo dia, ele recebeu um calouro que se intitulava José Maria Chiado, torcedor do Fluminense (Ary Barroso era Flamengo).
“Eu nasci no Estado do Rio, não é seu Ary? Quem nasce no Rio não é Fluminense? Campeão e tal.”
Já aborrecido, Ary mudou de assunto e perguntou o que o seu Chiado ia cantar.
“Eu vou cantar um sambinha”, disse o calouro.
Barroso reclamou de novo: “? É o tal negócio, vai cantar música brasileira é sambinha. Se ele viesse aqui cantar um mambo, ele diria vou cantar um mambo, não era mambinho não, era mambo no duro. Mas vai cantar música brasileira é sambinha, na base do deboche”.
E indagou: “Muito bem seu Chiado, qual é o sambinha que o senhor vai cantar?”
E a resposta: “Aquarela do Brasil”. (Composição de Ary Barroso)
Nova bronca do Ary que, afinal, mandou o Chiado cantar.
E ele: “Brasil, meu Brasil brasileiro…, vou cantar-te nos meus velsos“…
Foi o suficiente. Soou o gongo e Ary Barroso detonou: “Pode parar, seu Chiado. O senhor pode cantar nos seus velsos, nos meus verrrrsos o senhor não vai cantar, não. Vá aprender português, seu Chiado. Sambinha é o diabo que o carregue!
Em 1945, fazia sucesso no Brasil uma marchinha de carnaval, de autoria de Roberto Martins e Erastótenes Frazão e gravada pelo conjunto “Anjos do Inferno”. A música se chamava “O cordão dos puxa-saco”. No início da letra, chegam a mencionar uma música de 1909, chamada “No bico da chaleira”, também em homenagem ao tema “puxa-saquismo”.
Vamos voltar no tempo e analisar esta crônica que parece eterna dos costumes brasileiros. O hábito de bajular os poderosos já era uma realidade no Brasil. Segundo o sítio digital recanto das letras, o general José Gomes Pinheiro Machado, senador pelo Rio Grande do Sul, presidente do Partido Republicano Conservador, era um homem forte do Legislativo brasileiro e por 20 anos, entre 1895 e 1915, exercendo grande influência sobretudo no governo de Afonso Pena (1906-1909), Nilo Peçanha (1909-1910) e Hermes da Fonseca (1910-1914).
Consta que o senador mantinha no seu gabinete uma pequena chaleira com água quente para alimentar sua bomba do chimarrão. Quando políticos iam visitá-lo, disputavam o privilégio de segurar a chaleira para o chimarrão que o caudilho tomava, poupando ao senador o trabalho de preparar ou servir sua bebida preferida.
Na ânsia de serem os primeiros, seguravam a chaleira por onde melhor calhasse: pelo cabo, pelo bojo e até pelo bico – amiúde queimavam os dedos. Tudo para cair nos favores do senador.
O hábito acabou gerando o verbo chaleirar, praticado pelo chaleirador, o adulador, puxa-saco, etc. Isto dito da moda deu ensejo ao surgimento de uma canção carnavalesca da autoria de um famoso mestre de bandas que se ocultava sob o pseudônimo de Juca Storoni e foi o maior sucesso do Carnaval de 1909.
Senador José Gomes Pinheiro Machado
Iaiá me deixe subir esta ladeira, Que eu sou do grupo do pega na chaleira, Iaiá me deixe subir esta ladeira, Que eu sou do grupo do pega na chaleira.
Na casa do Seu Tomaz/Quem grita é que manda mais
Que vem de lá, Bela Iaiá, Ó abre alas, Que eu quero passar, Sou Democrata, Águia de Prata, Vem cá mulata, Que me faz chorar…
Já em 1945, depois do fim da ditadura e do Estado Novo, houve uma maior abertura em relação às letras de músicas, controladas e censuradas pelo então departamento de censura da época, o DIP.
O Cordão dos Puxa-saco, então, fazendo expressa referência à canção de 1909, tem como mote a crítica àqueles que bajulam os homens políticos e públicos, ou seja, os famosos puxa-sacos.
“Vossa Excelência / Vossa Eminência /Quanta referência nos cordões eleitorais!”.
E fica bem clara a hipocrisia quando se diz: “Mas se o “Doutor” cai do galho e vai pro chão/ A turma logo evolui de opinião”, mostrando que os bajuladores mudam logo de opinião a cada pleito eleitoral.
Na letra, conta-se e critica-se as homenagens e as circunstâncias, o apego ao poder e não ás pessoas, e o caráter volátil dos “puxa-saco” que evoluem de opinião sempre que há uma mudança do poder. Continua … muito atual…Segue a letra.
O refrão “Eu quero você como eu quero” pode enganar. A expressão “como eu quero” pode ser interpretada como intensidade, mas na verdade acaba querendo dizer “do meu jeito”
O Eu-lírico feminino, em primeira pessoa, estabelece os pedidos (ordens) para promover o retoque para o seu parceiro de relacionamento. Ela estabelece quais são as condições para que ele se torne uma pessoa melhor, sendo que o “melhor” é que ele seja do jeito dela.
No começo, já fala um pouco da postura do parceiro. “Diz pra eu ficar muda” e “cara de mistério” revela que ele deve ter uma atitude mais dominadora e inacessível.
Em seguida, quando afirma “tira essa bermuda, Que eu quero você sério”, é uma sugestão de que o parceiro abandone a informalidade da bermuda e traje algo mais compatível com um homem.
Os meros “solos de guitarra” não são suficientes para ela…
Durante todo o tempo, ela desvaloriza o “rascunho” que é seu parceiro e valoriza a “arte final” que é a forma com a qual ela acha que ele deve ser.
Assim, o refrão quando diz: “Eu quero você como eu quero”, quer dizer que ela não o quer do jeito que ele é, tanto que, longe do seu domínio, ele vai de mal a pior… e ela ensina como ele deve ser melhor.
No site http://decifrandoamusica.blogspot.com.br há um manuscr
Paula Toller e Leoni, em entrevistas, falaram um pouco da música:
“Como eu quero nunca passou pra mim como a relação nociva de um casal, mas sim de uma música que falava daquele cara que tenta, mas não consegue enganar a mulher, pois ela com seu olhar ´raio x’ consegue ver tudo que ele tenta esconder ou suas gracinhas para conquistá-la ou distraí-la.”
“a ideia da letra surgiu por causa de um amigo meu e da Paula que tinha sérios problemas com a namorada. Ela queria transformá-lo, que parasse de tocar e de compor para fazer uma coisa “mais séria”. E a música fala exatamente disso: “de como eu quero”, “você tem que ser do jeito que eu quero” e não “te desejo tanto” como muita gente confunde”, conta Leoni. Por isso que Paula Toller considera essa música muito tirana.
Como eu quero começou com uma ideia da Paula. Eu me lembro dela ter umas frases, dela me dizer estas frases, a gente andando de carro, ela meio falando coisas, quase oral, depois tinha que anotar pra não esquecer. Depois a terminou a música em casa, violão e voz
Muita gente descobre essa musica em camadas, muita gente acha que é uma música de amor e não é… a gente vivia num meio de músicos, e tinha essa menina que vivia no nosso meio mas ela não queria que o namorado dela fosse músico, queria que o namorado dela fosse sério, “eu quero você como eu quero” , era essa a brincadeira que a gente achava que era muito fácil das pessoas perceberem …”eu quero você como eu quero que você seja”
Consta que a inspiradora da canção seria a namorada de Beni Borja, então baterista da banda
Esse começo: Seja autoritário comigo, seja macho, não seja uma pessoa doce, sensível, adulto, nada de bermuda, “solos de guitarra não vão me conquistar”, vá fazer outra coisa,
E ela denuncia: você está numa cilada, fala claramente e as pessoas fazem questão em não perceber isso: você está por mim, eu estou por mim, estamos todos por mim, é só eu que interessa, e as pessoas ainda acham que é uma canção de amor”
Interessante que a Durante a produção do álbum discutia-se qual seria a música de trabalho. A gravadora (Warner Music) insistia para que fosse Alice (Não me escreva aquela carta de amor), mas a banda fincou pé e resolveu trabalhar em cima da música Pintura Íntima.
Pouco antes de fechar o álbum, faltando ainda uma música, Como Eu Quero, que havia sido descartada pelo produtor, foi escolhida para completar o LP, numa decisão pessoal de Leoni e Paula.
“Tivemos que bater o pé para entrar ‘Como eu quero’. Faltava uma música e o Liminha foi escutar o que a gente tinha. Na época, a gente achava que balada não tinha nada a ver” PAULA TOLLER
Diz-se que Liminha (produtor do disco) não gostou muito do refrão original, que seria meio triste, e Leoni mudou no dia seguinte e gravou e acabou sendo a grande balada do disco, talvez o maior sucesso.
Poucas Músicas de Dorival Caymmi são tão conhecidas quanto Maracangalha. Na verdade, trata-se de uma letra simples, uma melodia também simples, que faz da música uma daquelas que parece ter sido feita desde sempre… Stella Caymmi, neta do compositor, contou assim a história da música, no seu livro “Dorival Caymmi: o mar e o tempo“
“O samba foi feito na tarde do dia 29 de julho de 1955, uma sexta-feira, em São Paulo, enquanto pintava um auto-retrato, em seu apartamento. De repente, veio em sua mente uma frase de Zezinho, seu amigo de infância em Salvador: ‘Eu vou pra Maracangalha’. Dorival se lembra que ‘toda vez que eu dava a ideia dele vir ao Rio, ele desconversava. Isso me intrigava’. Mas logo depois o amigo se abriu. Zezinho tinha uma amante em Itapagipe, Áurea, e com ele tinha quatro filhos.
– Como é que você sustenta essa filharada? – O compositor perguntou espantado
– Eu me viro. Respondeu Zezinho.
Mas Dorival queria saber mais
– Como é que você faz para vê-la sem que Damiana desconfie?
– Eu forjo um telegrama para mim mesmo e digo: ‘Eu vou pra Maracangalha’. É lá que eu compro saco de encher açúcar para embarcar, e ela não desconfia. – Explicou Zezinho.
“Maracangalha saiu por isso. Fiquei apaixonado pela sonoridade da palavra. Agradeço tanto a Zezinho” – Comenta o compositor, revelando a fonte de sua inspiração.
É importante salientar que Maracangalha é um distrito do município de São Sebastião do Passé (BA).
Por causa da música, há no distrito uma Praça Dorival Caymmi (em forma de violão, construída em 1972). Além disso, há a Usina Cinco Rios (1912), e que chegou a produzir 300 mil sacas de açúcar por ano. Era lá que Zezinho comprava as supostas sacas de encher açúcar.
Numa entrevista, Caymmi conta também que recebeu uma “sugestão” para que o nome de Anália fosse modificado:
Caymmi conta a história no vídeo abaixo:
Daí, comecei a cantarolar a música e a letra nascendo ao mesmo tempo. Eu vou pra Maracangalha/Eu vou!/Eu vou de liforme branco/Eu vou!/Eu vou de chapéu de palha/Eu vou!. Estava bom eu estava gostando, Então continuei e quando cheguei à parte que diz: “Eu vou convidar Anália’, uma vizinha, dona Cenira, perguntou lá na janela pra minha mulher: – Dona Stela, o que é que seu Dorival está cantando aí, tão bonitinho? E Stela, “Caymmi, diona Cenira quer saber o que você está cantando. Respondi. Estou fazendo uma música que fala de um sujeito, que sai de casa feliz pra se divertir. Ele vai pra Maracangalha, vai convidar Anália, ao que interrompa a vizinha:
– E por que o senhor não põe Cenira, em lugar de Anália?
– Fica para outra vez, Dona Cenira, eu lhe disse, me desculpando.
Eu vou pra Maracangalha
Eu vou!
Eu vou de uniforme branco,
Eu vou!
Eu vou de chapéu de palha,
Eu vou!
Eu vou convidar Anália,
Eu vou!
Se Anália não quiser ir,
Eu vou só!
Eu vou só!
Eu vou só!
Se Anália não quiser ir,
Eu vou só!
Eu vou só!
Eu vou só sem Anália
Mas eu vou!…
Fonte: Caymmi, Stella. Dorival Caymmi. O mar e o tempo, São paulo, Ed. 34, 2001, p. 329.
Vinicius Cantuária é nascido em Manaus, crescido no Rio de Janeiro, e tem alguma composições belíssimas. Uma delas, gravada por Caetano Veloso, conta uma história de uma menina que ele viu na praia, e que se eternizou com o nome “Lua e Estrela”.
Ele conta a história a Rui Godinho, no terceiro volume do seu livro “Então, foi assim?” :
“Essa história é linda e verdadeira. Eu morava, na época, na casa do Arnaldo Brandão, um baixista, que depois tocou comigo na outra banda da Terra durante anos depois participou do Brylho (A noite vai ser boa..). É o Arnaldo tocava baixo com os Doces Bárbaros. Ele tinha um filho, que é o Rodrigo, que hoje toca numa banda em São Paulo.
Era uma sexta-feira e o Arnaldo falou: “Olha, hoje depois do show dos Doces Bárbaros a gente vai para o aniversário da Bethânia (ou da Gal sei lá, de alguém)… e vai ter uma festa depois. O Arnaldo e a Cláudia – que era mulher dele, mãe do Rodrigo – perguntaram: “Pô, fica tomando conta do Rodrigo hoje, pode ser? A gente vai chegar umas duas, três da manhã. Eu falei: “Claro. Sou o padrinho do Rodrigo, estou morando na casa de vocês podem ir”. Só que deu meia-noite, uma, duas, três, quatro horas e eles não chegavam nunca. Chegaram quase seis da manhã dessa tal festa. E eu estava acordado porque o Rodrigo já estava querendo acordar. Quando eles chegaram já estava claro”, relembra.
Então, Cantuária resolveu aproveitar o dia.
“ Como eles moravam no Leblon, coloquei uma bermuda, uma camiseta e fui até a praia. Saí andando no Leblon até o Arpoador. Cheguei ao Arpoador, era umas seis e pouco da manhã, muito cedo . O público de Arpoador não vai tão cedo à praia. Mas foi um fato curioso, porque eu sentei a uns quarenta metros de mim tinha uma menina sentada. Eu não a conhecia e ela não me conhecia. Ela me olhava e eu olhava para ela. Mas todo mundo que chegava à praia me conhecia e a conhecia. Então a distância entre mim e ela foi encurtando. As pessoas foram chegando em mais ou menos, a gente se aproximou, se olhou. Aí teve uma hora que ela saiu de onde estava e chegou mais perto. Ficou ali conversando com amigos. Ninguém nos apresentou, mas eu sentia que tinha uma empatia rolando entre a gente. Ela se dirigiu ao mar. Quando foi mergulhar, eu vi claramente que ela tinha um anel. Aí deu aquele estalo. Sabe quando bate um raio, uma coisa assim”, revela.
Esse “estalo” a que Vinicius se refere, outros compositores identificam como centelha criativa, inspiração, luz, mote para a composição musical.
“Isso eu conto hoje e talvez eu tenha até imaginado. Mas na hora eu vi. Bateu um raio, raio de sol, né? Consegui ver bem de perto que ela tinha um anel de lua e estrela. Como eu fui caminhando, voltei com a música na cabeça: [cantarolando] Menina do anel de lua e estrela, raio de sol no céu da cidade. Qual era o nome dela? Quem é você, qual o teu nome/ conta pra mim, diz como eu te encontro. Aí de noite, a gente ia pra onde? Pro Baixo, né? Quem sabe te encontro de noite no Baixo /deixa ao destino, deixa ao acaso… A música foi toda sendo formada daquela história. Eu voltei, peguei o violão e a música saiu toda”, relata.
A música estava criada, precisava apenas de um grande intérprete que a projetasse nacionalmente.
“Aí eu comecei a tocar com Caetano que adorava as minhas músicas. Mas eu nunca tinha mostrado Lua e Estrela. Não sei porquê. Até que um dia o Arnaldo falou: ‘Porra! Você nunca mostrou Lua e estrela pro Caetano’. Aí o Caetano falou: ‘Lua e estrela, que nome lindo, mostra pra mim. Mostrei, ele adorou, e como estava começando a gravar o disco Outras palavras, falou pra mim: ‘Vou gravar Lua e estrela vamos’? Eu falei: ‘Claro, vamos’! E foi isso. Essa é a verdadeira história da música”, confirma o compositor.
Vinicius enfatiza que é a “verdadeira”, porque há diversas falsas histórias, inventadas por pretensas musas.
“Anos depois, claro, eu fui encontrar a menina, que se chama Tize. Essa história é a verdadeira, mas há muitas histórias paralelas. Uma ocasião, por exemplo, eu estava com amigos, sentado num bar no Baixo Leblon, no auge do sucesso da música. Aí apareceu uma menina que sabia que eu tocava com Caetano, Puxou a conversa e falou assim: ‘Ah! Pois é, essa música o Caetano fez pra mim’. Ela nem sabia que eu era o autor da música. Muito engraçado [risos]. Tem muitas histórias com essa música, mas a verdadeira história é essa. Eu fiz pra essa menina, que eu não sabia o nome, que tinha um anel de lua e estrela. A letra não é nada mais nada menos do que eu querendo reencontrar essa menina. Então essa é a história”, conclui.
Em 21 de outubro de 1967, a música popular brasileira não era mais a mesma. Um festival de música popular estabelecia um contraponto e uma dialeticidade entre o novo e o velho; entre a música nacional tradicional e a influência das guitarras elétricas; a Bossa Nova e a Jovem Guarda. Tudo isso no meio da ditadura militar.
O que deveria ser um programa de televisão transformou-se num evento de proporções políticas, históricas, sociológicas, culturais… nunca música foi coisa tão séria…
Tendo o festival ocorrido em plena ditadura militar, o pano de fundo está no duelo ideológico entre a “verdadeira” música brasileira, e a música dita “jovem”. Roberto Carlos, Caetano Veloso, Chico Buarque de Holanda, Gilberto Gil, Edu Lobo, Nara Leão, Nana Caymmi, Jair Rodrigues, MPB-4 e Elis Regina, todos eles estavam ali defendendo canções belíssimas, cada uma com sua história.
Esta noite, em 21 de outubro de 1967, foi de forma belíssima registrado no documentário “Uma Noite em 67”, dirigido por Renato Terra e Ricardo Kalil, onde mostra o surgimento de uma série de vertentes que, nas décadas seguintes, passaram a ser chamadas de MPB.
No período que antecedeu à noite, havia um clima de efervescência política, cultural, ideológica, com passeatas (inclusive uma contra a guitarra elétrica que tomou a avenida Brigadeiro Luís Antônio em junho de 67, liderada por Elis Regina) tomando conta do país.
Naquele momento começavam a surgir canções de protesto. O Tropicalismo, com Gil e Caetano, ali dava sinais de que revolucionaria a música brasileira.
Aquele festival, que foi conhecido como o festival da vaia, mescla imagens do festival com depoimento dos artistas, mais de 40 anos depois. Narra o momento histórico de Sérgio Ricardo, que vaiado de maneira incompassível com Beto Bom de Bola, quebra o violão e o atira contra a plateia.
O documentário, depois de mostrar a célebre cena de Sérgio Ricardo (que diz não ter se arrependido do que fez, mas hoje, jogaria, no máximo, um cavaquinho).
Elis Regina ganhou o prêmio de melhor intérprete, com o “cantador” , e as cinco primeiras colocadas em muito refletem sobre a música brasileira da época.
A quinta colocada, Maria, Samba e Carnaval, um belo samba, mostra como Roberto Carlos, vaiado de maneira violentíssima, consegue ser um intérprete espetacular. Divertido é seu jeito durante as entrevistas.
Caetano se coloca no centro do debate, colocando a Guitarra Elétrica e com sua música Alegria, Alegria, muito vaiada no início, e consagrada no final com gritos de “já ganhou” do público. Embora tenha ficado em quarto lugar, foi o maior sucesso após o festival. Plantada a semente do Tropicalismo.
Chico Buarque, o “mocinho” do espetáculo, segundo Paulo Machado de Carvalho, já que, para ele, o festival era como um programa de luta livre. “Tinha que ter o mocinho, o bandido, a heroína etc”. Chico diz ter se surpreendido com Gil e Caetano com Guitarras e trajes modernos: “Eles (Chico, Caetano, os Mutantes) estavam lá todos fantasiados e eu de smoking. Aí fiquei com aquela cara… de smoking”, diz Chico, que defendeu a belíssima Roda-Viva, que ficou em terceiro lugar.
Gilberto Gil apresentou Domingo no Parque, música genial que ficou em segundo lugar (Sérgio Cabral, um dos jurados, diz ter se arrependido de não ter votado nela para primeiro lugar – eu concordo com ele). Domingo no Parque era acompanhado pelos Mutantes (Sérgio, Arnaldo e Rita Lee, lindíssima), em arranjo cheio de acordes elétricos. Poucos sabem, mas Gil estava em pânico duas horas antes do festival começar. Precisou ser retirado da cama para se apresentar.
As entrevistas nos entreatos são engraçadas (há muitos cigarros, engraçado como mudou a concepção do ato de fumar), fala-se dos cílios postiços de Maria Medalha (que defendeu com Edu Lobo a campeã Ponteio(numa bela letra de capinam para a música de Edu).
Edu Lobo e Chico mostram que ficaram incomodados por serem chamados de “velhos” pelos “Tropicalistas”, e Chico confessa ter se sentido só em certo momento.
Ponteio, como campeã, é uma bela música, de Edu Lobo e Capinam, e coroa um espetáculo em que vaia, efervescência política, guitarras elétricas e juventude, fez com que a música brasileira jamais fosse a mesma.
Zuza Homem de Mello, no seu livro “A era dos Festivais: uma parábola”, arremata:
Inegavelmente, porém, o que mais marcou as propostas musicais apresentadas no III Festival da Record foi a evolução dos dois artistas baianos: Gilberto Gil e Caetano veloso. As letras de suas composições tinham coincidentemente a mesma forma de slides; os arranjos soavam com uma ruptura dos padrões estabelecidos, ainda que sobre ritmos essencialmente brasileiros (baião e marcha), dando ao resultado final o esboço de uma estética sintonizada com o que acontecia no mais efervescente período da década de 60″
Zuza também faz referência que as músicas de festival, a partir daí, passaram a ser um veículo de crítica social, sobretudo contra a ditadura militar, mas cantadas de forma a parecerem canções inocentes, de modo que a Censura não percebesse, mas a plateia, sim.
No começo da Carreira, Gal costa, pelo seu timbre único e pelo seu jeito suave de cantar, chegou a ser chamada de “João Gilberto de Saias”. Mas por trás daquela voz inconfundível existe uma mulher ousada, que arrisca, e não foram poucas vezes que Gal saiu da sua zona de conforte de uma das maiores cantoras da música brasileira de todos os tempos para arriscar.
Apenas para citar de memória, posso fazer referências a “Divino, Maravilhoso”, que apresentou em 1968, no Festival da Record, com cabelo black power, roupas berrantes e atitudes agressivas, ou a capa do disco India, em que logo na capa do LP, tinha uma foto em close da cantora, somente com uma tanga vermelha (na verdade, a foto era da tanga de Gal).
Mas poucos escândalos foram tão comentados quanto o show”O Sorriso do Gato de Alice”. O show foi dirigido pelo controvertido o diretor teatral Gerald Thomas. Estreou no Rio de Janeiro, em setembro de 1994, e causou muita polêmica.
Duas cenas chamam inicialmente a atenção: a primeira, logo no início do espetáculo, quando Gal surgiu, arrastando-se sobre um teto cenográfico como se fosse uma gata vagando pela cidade sob a lua. O público, na noite da estreia, chegou a vaiar Gal.
Mas o melhor estava por vir. Durante a música Brasil (Brasil, mostra a tua cara / Quero ver quem paga pra gente ficar assim), de Cazuza, Gal, que cantava com algo que parecia um pijama, abriu a blusa e cantou com os seios à mostra.
Foi praticamente capa de todos os jornais do Brasil. Vieram inúmeras críticas, piadas; alguns, mais moralistas, indignados; outros, fãs de Gal, aturdidos. Chegaram a dizer que as propostas de Gerald Thomas oprimiam Gal.
Em duas entrevistas, Gal se manifestou sobre o tema. A primeira delas foi no ProgramaRoda Viva, da TV Cultura:
Gal Costa:Não me arrependi em nenhum momento de ter feito o espetáculo com Gerald Thomas. Era o que eu queria. Acho que eu tenho muita honra e muito orgulho de ter feito esse espetáculo. Acho que era um espetáculo belíssimo, cenicamente era lindo, era uma espetáculo bem acabado, que eu acho o Gerald Thomas talvez o melhor encenador – estou falando encenador – brasileiro. A luz era deslumbrante, o cenário era lindo. Eu não me arrependo em nenhum segundo. Eu fazia o espetáculo com o maior prazer, não me sentia oprimida, como a imprensa falou, que o Gerald me oprimiu, não me oprimiu, porque eu fiz aquilo que eu quis. Eu só faço aquilo que eu quero. E eu me sentia bem e acho que faz parte da minha história. Quem conhece a minha história sabe que eu sou ousada e que eu faço essas coisas. Eu sei que elas têm um preço, mas eu encaro.
Gal Costa: Eu, na verdade, eu fiquei um pouco surpresa. Eu sabia que algumas pessoas iriam se chocar com essa atitude. Eu fiquei impressionada com a quantidade, com o número de pessoas que se chocaram por ver um peito de uma mulher de fora, num palco. Eu acho que aquilo era colocado de uma maneira tão digna, era um momento tão importante, quer dizer, no momento em que eu cantava Tropicália, era um momento que estava ligado à história do Tropicalismo, à história dessa irreverência, dessa coisa que ele falou, de comportamento. Estava ligado a isso. Na verdade, aquilo era um pouco uma retomada da minha carreira. Eu cantei coisas do início da minha carreira, gravações. E a atitude também de entrar no palco, a atitude inusitada de entrar no palco como uma gata, não entrar como uma estrela, é engraçado como isso também incomodou as pessoas. E as pessoas reclamam, reclamam que a gente é igual. O que eu tenho medo é de me estagnar, de ficar igual. Podia entrar no palco, ao som de uma banda, com um vestido lindo, uma mulher bonita, e pronto…cantar, mas não é isso que eu quero. Eu prefiro, entendeu, ir por caminhos mais difíceis até porque eu sei que essas coisas provocam reação, provocam polêmica, mas para mim são mais enriquecedoras, porque me dão coisas novas, à minha personalidade.
O brasileiro é supersticioso. Roberto Carlos, mais supersticioso ainda. Suas superstições são tão fortes, que, em razão delas, Roberto não canta algumas músicas que gravara anteriormente, pois se recusa a cantar palavras negativas, como mentira, mal, ou coisas do gênero. Segundo Paulo César de Araújo, na biografia não autorizada que fez sobre o cantor (Roberto Carlos em detalhes, Planeta, 2006), o Rei não canta mais Quero que tudo vá para o inferno (por causa da palavra inferno),Como dois e dois (por causa do verso tudo vai mal) ou na música É preciso saber viver ele substitui a frase “Se o bem e o mal existem” por “se o bem e o bem existem”.
Por isso, ainda segundo Paulo Cesar, vamos destacar 10 superstições de Roberto Carlos:
1 – Não gosta de roxo, e sobretudo, não gosta da cor marrom. (A sua preferida, quase todos sabem, é azul. O repúdio ao marrom vem por causa do seu avô, Joaquim Braga, que nunca montava a cavalo vestido de marrom);
2 – Não passa debaixo de escada;
3 – Sempre sai dos lugares pela mesma porta que entrou;
4 – Jamais volta a fita do gravador (bem, agora não há mais fita nem gravador…)
5 – Nunca rabisca uma seta de cabeça para baixo;
6 – Nunca assina nenhum documento importante na lua minguante;
7 – Não começa nenhuma temporada ou gravação de disco em agosto;
8 – Deixa sempre para as almas o último pedaço de qualquer coisa que estiver comendo;
9 – Não gosta do número 13 (não senta em poltrona de avião com número 13, por exemplo. Na verdade, Roberto gosta do número 5);
10 – Procurar repetir sempre o mesmo movimento da tranca da porta.
Alguma delas coincide com a sua? Por via das dúvidas, o texto vai todo em azul… Marrom? Que nada!!!