“Não planto capim guiné, pra boi abanar rabo…”

Em 1983, Raul Seixas gravou, no disco “Carimbador Maluco”, uma música que transita entre o baião e uma moda de viola: trata-se de “Capim Guiné”, feita em parceria com Wilson Aragão, baiano da Piritiba narrada na canção.

A música, cantada a partir de um eu-lírico do sertão, faz referência ao esforço que fez para que o sítio tivesse sucesso, quando de repente uma série de intempéries, bichos e pragas estão destruindo a roça….

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A canção é praticamente toda de  Wilson Aragão, compositor de Piritiba, tendo Raul mudado pequenos trechos da letra. Ele conta, numa entrevista ao Soterópolis, sua experiência com Raul:

“Eu conversei com Raul tímido, eu ficava mais escutando Raul falar do que eu falava. Porque Raul era um cara que a abeça dele era a mil, filosofava demais, ele questionava as coisas demais, eu ficava um pouquinho assustado. Então a primeira música eu já tinha feito ela, a música tava pronta, Raul fez, ‘não velho, deixa eu botar o nome de tua terra nessa música, Piritiba vai ficar conhecida no Brasil todo’, então, ele interferiu na letra, que era “Comprei um sítio/Plantei Jabuticaba/dois pé de guabiraba”, ele disse ‘plantei um sítio no sertão de Piritiba”, mas aí, dois pé de que, Raul? “já achei uma planta misturou minhas guabiraba com pindaíba saiu guataíba…” 

Wilson Aragão já tinha composto Capim Guiné e tocava as música nos barzinhos do interior da Bahia desde 1979.

O interlocutor do eu-lírico, a quem ele se refere como “cumpade”, pode ser um vizinho, amigo, que está vendo tudo e fica parado, inerte, “com cara de veado que viu caxinguelê”, mas pode ser também um diálogo com Deus, meio que reclamando da má-sorte da lavoura.

Mas existe um fato por detrás da canção.

Era época da ditadura militar, o compositor “retado da vida” porque o pai perdeu as terras para grileiros, e que tiveram que “vender tudo e sair corrido”

Na verdade, cada um dos animais era um personagem: “um deputado, um gerente de banco, até o Presidente da República”

Fonte: http://www.irdeb.ba.gov.br/soteropolis/?p=11332

Plantei um sítio
No sertão de Piritiba
Dois pés de guataiba
Caju, manga e cajá

Peguei na enxada
Como pega um catingueiro
Fiz acero, botei fogo
“Vá ver como é que tá”

Tem abacate, jenipapo
E bananeira
Milho verde, macaxeira
Como diz no Ceará

Cebola, coentro
Andu, feijão-de-corda
Vinte porco na engorda
Até o gado no currá

Com muita raça
Fiz tudo aqui sozinho
Nem um pé de passarinho
Veio a terra semeá

Agora veja
Cumpadi, a safadeza
Cumeçô a marvadeza
Todo bicho vem prá cá

Num planto capim-guiné
Pra boi abaná rabo
Eu tô virado no diabo
Eu tô retado cum você

Tá vendo tudo
E fica aí parado
Cum cara de viado
Que viu caxinguelê

Suçuarana só fez perversidade
Pardal foi pra cidade
Piruá minha saqüé
Qüé! Qüé!

Dona raposa
Só vive na mardade
Me faça a caridade
Se vire e dê no pé

Sagüi trepado
No pé da goiabeira
Sariguê na macaxeira
Tem inté tamanduá…

Minhas galinha
Já num fica mais parada
E o galo de madrugada
Tem medo de cantá

Num planto capim-guiné
Pra boi abaná rabo
Eu tô virado no diabo
Eu tô retado cum você

Tá vendo tudo
E fica aí parado
Cum cara de viado
Que viu caxinguelê

 

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