Certa vez compareci numa cerimônia de casamento em que uma das músicas da trilha sonora é a conhecida “Every breath you take”, do The Police. Achei curioso como certas pessoas enxergam nessa canção como um hino de devoção e cuidado, como se o sujeito estivesse acompanhando cada passo, cada respiração, cada movimento da pessoa amada, que, ao final, “pertence” ao eu-lírico.
Na verdade, “Every breath you take” sempre me assustou. Não gostaria de receber uma declaração de amor por intermédio dessa canção. O eu-lírico se posiciona como um vigia, como um grande irmão que acompanha todos os seus passos, suas vacilações, suas imperfeições, enfim, é alguém que sufoca através do amor que, na verdade, se transforma em uma obsessão.
E não sem razão, que consultando o livro “Músicas e Musas”, de Michael Heatley e Frank Hopkinson, encontrei duas declarações de Sting que corroboraram minha tese sobre o caráter obsessivo da canção, por intermédio da qual alguém se vê obcecado por outra pessoa.

Segundo Sting, a música é “uma canção fruto da experiência de ciúme e possessividade… uma canção sinistra, perversa, disfarçada num contexto romântico”
Repare que a introdução inconfundível da canção poderia muito bem ser usada num filme de suspense, de perseguição.
Sting compôs a canção no refúgio jamaicano de Goldeneye, segundo Sting, na mesma escrivaninha em que Ian Fleming (criador do 007) escrevera a próxima aventura de james Bond.
Sting, numa entrevista à BBC, afirmou: “Eu acho que a canção é muito, muito sinistra e cruel, e as pessoas a interpretaram como uma singela canção de amor”.
Percebe-se claramente o quão egoísta é a canção. O eu-lírico afirma textualmente que percebe o que o ser amado não consegue perceber: o fato de que ele (ser amado) pertence ao eu lírico, que de maneira obsessiva observa, segue, persegue e não consegue suportar a dor de não ser correspondido naquele instante.

Na canção, o sujeito observa cada respiração, cada passo, cada sorriso, cada promessa, cada movimento, cada noite, e não se conforma, afinal, a musa “lhe pertence”. Acabou sendo uma precursora daquilo que hoje se conhece como “stalkers”
O baixo é preponderante (Sting é baixista), a estrutura melódica e harmônica é simples, e consta que a canção teria sido inspirada no fim do casamento entre Sting e sua primeira esposa (Frances Tomelty). “Every Breath You Take” foi lançada no disco “Synchronicity” em 1983, e foi um sucesso estrondoso, talvez o maior sucesso da banda.
Sting e Frances Tomelty