No filme “O homem que matou o facínora” estrelado por John Wayne e dirigido por John Ford, há uma frase que se tornou clássica: “quando o fato fica maior que a lenda publique a lenda“.

Jardim da fantasia, de Paulinho Pedra Azul, gravada em 1973, é uma das canções em que, vez ou outra, escuto uma versão de que se tornou muitas vezes maior do que sua verdadeira história. Reza a lenda que Paulinho compôs a música para sua ex-noiva, que teria morrido num acidente.
Ainda segundo a lenda, a imagem derradeira que o compositor teria de sua noiva era na ocasião do acidente, com sangue escorrendo no canto de sua boca. Como não seria deste modo que ele gostaria de preservar a lembrança, ele compôs a música para ela.

Logo, no trecho que diz “tua boca pingava mel”, era uma referência ao sangue que escorria da boca.
Em outro momento, quando a letra trata Outra de voar para o céu azul e pela estrada do além em busca da amada, em cujo lugar ele não sabia onde estava, então pergunta “onde estará meu bem?”.
Paulinho Pedra Azul esclarece, no livro “Então, foi assim?”, de Ruy Godinho a verdadeira história da canção e como a lenda o persegue (ah, e a letra também não tem nenhuma relação com o pássaro bem-te-vi) :
“Jardim da Fantasia foi uma das primeira músicas que eu compus. Eu tinha uns 17 anos, por aí… Eu me separei de minha primeira namorada. Ela estava com 12 anos quando nós começamos a namorar e eu tinha uns 15 anos. Depois nós nos separamos porque eu tive que mudar para Vitória, Espírito Santo, para a casa de um tio meu, para estudar o colegial. E nessa viagem de Pedra Azul para Valadares [MG] e de lá pegando o trem para Vitória, eu comecei a compor essa música, Jardim da Fantasia, que apelidaram carinhosamente de “bem-te-vi”. E o bem te vi da música, realmente, não tem nada a ver com passarinho. É eu vi você andar por um jardim em flor…” explica Paulinho, sem dó nem piedade do imaginário coletivo.
E então ele explica de onde vem a lenda:
“E a partir daí começaram a inventar algumas histórias. Disseram que eu tinha feito essa música para uma namorada minha que tinha morrido. E essa música não tem nada de morte, só de vida. Por exemplo: por um jardim em flor… falaram que era o cemitério. E tua boca pingava mel diziam que era sangue pingando da boca de minha noiva. E a música foi feita apenas para uma separação, para dois adolescentes que tiveram dois anos de namoro e se separaram”, diverte-se Paulinho com a criatividade das pessoas”.

A musa ainda hoje está viva. Casou-se com um amigo de Paulinho, teve filhos maravilhosos e são felizes em Pedra Azul, garante ele.
“Essa música tem muita história. Eu tive um show numa cidade chamada Pouso Alegre, no Sul de Minas. Terminei o Show e eu costumo trocar de blusa suada para depois ir autografar os discos.
Aí teve um cara que incomodou demais. Ele estava empurrando, chorando e o deixaram entrar no camarim. O cara entrou e me abraçou. Eu pensei: ‘ Pô, esse cara deve ter adorado o show’.
Aí, ele falou: ‘Eu passei pelo mesmo problema que você passou. Eu também tive uma noiva que morreu’.
Eu dei um tempo, o abracei, e acariciei e lhe disse: ‘Olha, se minha música fez você lembrar de sua noiva que morreu, tudo bem e tal. Mas eu não tive noiva e nesse música ninguém morreu’.
Ele tornou a me apertar e disse: ‘Eu sei que você não gosta de tocar no assunto’. Aí, eu falei: ‘Não tem jeito’!
E não para por aí. Outro episódio muito engraçado aconteceu no interior de Minas Gerais. (…) Um belo dia, uma professora de determinada escola escolheu Jardim da Fantasia para ser interpretada pelas crianças. E ligou convidando Paulinho para ir até lá, que as crianças queriam fazer uma homenagem a ele.
“Eu disse: ‘ Vou com o maior prazer’. Cheguei à escola e ela falou que iriam abrir uma porta e teria uma surpresa para mim. Um pátio enorme, a porta se abriu e eu entrei. O que eu vi? Umas cento e cinquenta crianças, cada uma com um bem-te-vizinho nos dedinhos, levantando e descendo, cantando: ‘Bem-te-vi, bem-te-vi, andar por um jardim em flor’…
Eu achei aquilo maravilhoso. Mas por outro lado aquilo me incomodou e eu falei para a professora: ‘Olha, está tudo lindo, maravilhoso, mas o bem te vi aí da música não é do passarinho, não. É o mesmo que eu te olhei, bem que eu vi você andar por um jardim em flor’…
A professora se assustou e me falou quase em pânico: ‘PelamordeDeus! Jamais revele isso para essas crianças! Há três meses que elas estão recortando os bem-te-vis só pra cantar pra você!”
Paulinho Pedra Azul gravou Jardim da Fantasia, no primeiro LP dele, homônimo(1982).
Adorei! Obrigada pelo esclarecimento!
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No livro citado neste artigo não há nenhuma referência à música Jardim da Fantasia e nem existe entrevista com o Paulinho Pedra Azul.
Quem não acredita confira o livro pelo link:
Clique para acessar o Entao-Foi-Assim-Compositores-do-Amapa-vol1.pdf
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Renato, você está citando livros diferentes. O livro que você cita é de compositores Amapaenses. Paulinho pedra Azul tem esse nome, inclusive, porque ele nasceu em Pedra Azul, Município do Norte de Minas Gerais que faz divisa com a Bahia. Assim, o livro de Ruy Godinho – “Então, Foi Assim?”, se refere à primeira edição de seu livro, que tem compositores de todo Brasil. Espero ter esclarecido
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😂 sempre que vejo um bem-te-vi eu lembro da música e a lenda também chegou aos meus ouvidos quando ainda adolescente e já espalhei prlo mundo! 😂 bom saber, não espalho mais. Só a fantástica história 😂 adorei grazzie
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Mas às vezes a lenda é mais divertida do que a verdade…
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Já assisti um show do Paulinho Pedra Azul. Até os intervalos entre as músicas eram bons momentos. Como um bom mineiro, ficava contando seus causos. Não sabia que essa música também era cheia de causos. Muito bom.
Curioso, acabei achando um trecho da referida entrevista, nesse podcast: https://brasil61.com/noticias/entao-foi-assim-ed-27-jardim-da-fantasia-paulinho-pedra-azul-pefa190044
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Adorei saber a realidade…kkkkkkkk
Só assim não chora mais ouvindo Jardim da Fantasia. 😅
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Conheço essa “lenda” há décadas, e ela faz sentido toda a vez que ouço essa música… Fiquei triste em saber a história real, a lenda é bem melhor, rssss. Obrigado por compartilhar.
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