Rapte-me Camaleoa (De Caetano para Regina Casé em 1981)

A figura do camaleão é sempre associada ao mimetismo, à sua capacidade se se camulflar de acordo com o ambiente, com a temperatura, com a iluminação e pelo seu próprio estado emocional. Quando nos referimos a pessoas, a referência ao camaleão termina sendo uma figura de linguagem relacionada com a capacidade de mudança e de adaptação.

E foi a figura da Camaleoa que Caetano Veloso homenageou, no álbum “Outras Palavras” (1981), a atriz Regina Casé, na canção “Rapte-me Camaleoa”.

Conta Tom Cardoso, na obra biográfica “Outras palavras: Seis vezes Caetano”, diz que Caetano conheceu – e deslumbrou-se – com Regina Casé quando a viu encenando a peça “Trate-me Leão”, da Cia teatral Asdrúbal Trouxe o Trombone (formada por diversos atores que se tornaram posteriormente muito famososo, como Evandro Mesquita, Luiz Fernando Guimarães, Patrícya Travassos, entre outros). A amizade entre ambos transfornou-se num namoro fugaz (com o consentimento da esposa de Caetano, Dedé Gadelha, já que a relação de ambos era fundada no amor livre).

A letra é, ao mesmo tempo, um convite e uma manifestação de desejo, reveleda na última frase, adapte-me ao seu ne me quitte pas. Na letra da canção, a ideia da metamorfose, da adaptação própria do camaleão está sempre presente

Regina afirnou, em 2004: “eu e a Dedé éramos muito amigas, e continuamos sendo até hoje(…) Aquilo era um comportamento tão normal, no mundo inteiro”

A canção é uma declaração de afeto para Regina Casé, que Caetano namorou no início da década de 1980. “Ela se chamava ‘Camaleoa’ em uma peça (‘Aquela Coisa Toda’). Namorei ela nessa época rapidinho, um tempinho curto. Mas a adoro, sempre. É bem feitinha a letra. E tem de interessante o verso ‘rapte-me, adapte-me, capte-me, it’ s up to me’, que traz uma rima bilíngue“, disse em conversa com o escritor Eucanaã Ferraz…

A amizade deles dura até hoje. Regina Casé fez uma participação no filme de Caetano, Cinema Falado. Numa entrevista ao programa Roda Viva, falou sobre a amizade:

Eu estava trabalhando, ele foi assistir a uma apresentação nossa e gostou muito. Depois, foi conversar com a gente no camarim, daí a gente foi jantar e ficou amigo. Logo assim. Mas eu acho que foi muito por causa do trabalho. Se não fosse o trabalho, talvez no Rio a gente viesse a ser amigo, mas o que precipitou… E isso criou uma amizade já com muita qualidade, assim, legal.

Em 2014, Caetano fez uma postagem homenageando Regina Casé:

Quando conheci Regina, ela estava no palco. Eu, na plateia. Fiquei imediatamente apaixonado por sua personalidade e assombrado com seu talento. O Asdrúbal Trouxe o Trombone era um grupo de jovens fazendo o teatro viver. Dos trabalhos que ela fez ali à série de programas na TV, passando por atuações em filmes, peças e novelas, há uma linha coerente. Ela é uma das criadoras mais fortes que o Brasil produziu. O modo de tratar uma personagem em “Trate-me, Leão” já continha os gestos de Central da Periferia ou Esquenta! Não é por acaso que ela incomoda os eternos reaças colonizados. Filha de Geraldo e neta de Ademar, Regina é um farol na cultura popular brasileira. Celebro seu aniversário como um marco na minha vida pessoal e na história do Brasil”