Ave Maria no Morro foi um dos grandes sucessos de Herivelto Martins. Ele a compôs pensando na voz de Dalva de Oliveira — então sua esposa —, que cantava com ele e Nilo Chagas no Trio de Ouro. A primeira gravação saiu pela Odeon, com orquestra de Fon-Fon, registrada em 5 de junho de 1942

A música revela uma visão bucólica do morro ao fim da tarde, em que quem mora no morro vive pertinho do céu, e Herivelto utiliza as imagens, primeiro, do barracão sem telhado, sem pintura… faz uma referência à algazarra de pardais que se preparam para dormir… e quando vem o cair a noite, o morro reza, às 18:00m, a sua Ave-Maria… uma espécia de momento em que o morro para num momento de devoção coletiva.
Interessante que a primeira pessoa que ouviu a música, o vizinho e compadre Benedito Lacerda, não deu muita importância, achando que era música de Igreja. Muito pelo contrário: foi um retumbante sucesso…
Quem não gostou muito, no início, foi o Cardeal Dom Sebastião Leme, que via na música uma heresia. Não saberia ele, que anos depois, a canção seria executada em igrejas da Alemanha, Áustria, Suíça e outros países. Segundo o dicionáro Cravo “Ave Maria no morro”, a partir dos anos 1960, entrou para o repertório dos trabalhos litúrgicos de igrejas no Brasil e na Europa.
Não saberia ele que a música foi um sucesso internacional, sendo gravada por tantos autores, desde Andrea Bocelli (1994) até os Scorpions (1995).
Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello contam a história da canção, no seu livro “A canção no tempo – Volume 1 (p. 207-208)
Recém-chegado ao Rio, por volta de 1930, Herivelto Martins costumava frequentar o Morro da Favela, onde havia uma singela capelinha. Por muito tempo ele guardou a imagem dessa capela, com a intenção de usá-la numa canção que descrevesse de forma mística o anoitecer no morro.
Estando certa vez num bilharna Praça Tiradentes, Herivelto observou o barulho dos pardais se recolhendo às árvores para dormir:sentiu que isso daria samba e compôs os primeiros versos de “Ave Maria”: “Tem alvorada/ tem passarada/ alvorecer/ sinfonia de pardais/ anunciando o anoitecer”.
Entusiasmado com o esboço de samba que acabara de compor, resolveu mostrá-lo ao compadre Benedito Lacerda, na época seu vizinho na Ilha do Governador.
O próprio Herivelto relatou em depoimento para o Arquivo da Cidade do Rio de Janeiro, em 1983: “ Eu me preparei para mostrar ao Benedito essa segunda parte. Ensaiei com a Dalva, bem ensaiadinho, e todo animado fui procurá-lo. ‘Ouve aqui, Benedito, este negócio que eu fiz.’ E então cantamos, cantamos, a Dalva com aquela voz bonita e eu, no violão, crente que estávamos agradando, pois estava mesmo uma beleza. Terminada a cantoria, uma decepção. O Benedito tirou os óculos, esfregou os olhos e disse com a maior frieza: ‘Meu compadre, isso é música de igreja. Vamos fazer música pra ganhar dinheiro, meu compadre’. E, para amenizar o meu desapontamento, acrescentou: ‘Tá bem, tá bem pra vocês cantarem no rádio, mas isso não é música pra dar dinheiro. Cadê aquele sambinha que você me mostrou outro dia?”‘.
Desiludido com a rejeição, Herivelto arquivou a composição, só a concluindo meses depois, quando aprontou a primeira parte ( “Barracão de zinco / sem telhado / sem pintura / lá no morro…”).
Assim começou “Ave Maria no morro”, com alguma desilusão. Constituiu-se contudo num grande sucesso, embora o Cardeal Dom Sebastião Leme tenha considerado a canção uma heresia e tenha pedido sua proibição. A proibição só não foi efetivada devido às boas relações de Herivelto com os censores da época.

A letra:
Barracão de zinco
Sem telhado, sem pintura
Lá no morro
Barracão é bangalô
Lá não existe
Felicidade de arranha-céu
Pois quem mora lá no morro
Já vive pertinho do céu
Tem alvorada, tem passarada
Alvorecer
Sinfonia de pardais
Anunciando o anoitecer
E o morro inteiro no fim do dia
Reza uma prece ave Maria
E o morro inteiro no fim do dia
Reza uma prece ave Maria
Ave Maria
Ave
E quando o morro escurece
Elevo a Deus uma prece
Ave Maria.
maravilhoso! continue a postar. amo seu conteúdo!
CurtirCurtir