“Bicho” (1977) – um dos (muitos) cancelamentos de Caetano. A briga com a imprensa e a patrulha ideológica

O cancelamentos em redes sociais no Século XXI é um fenômeno aparentemente inexorável. Já se fala em “cultura do cancelamento”, como uma espécie de boicote coletivo e difuso a partir de determinada atitude ou opinião expressada; o cancelamento, pois, é uma manifestação pública de censura a uma empresa, artista, atleta e celebridade (ou subcelebridades) em geral.

Esta execração pública, que hoje é difusa e se manifesta pelas redes sociais, era promovida no Século XX pela mídia, quando não concordava ou criticava o posicionamento de determinado artista.

Este fenômeno ocorreu com Caetano Veloso, em 1977, quando ele lançou o disco “Bicho”.

O disco contém algumas canções que se tornaram verdadeiros clássicos de Caetano, como “O Leãozinho” “Tigresa” e “Alguém cantando”. No entanto, provocou uma verdadeira saraivada de críticas da imprensa, que cobrava de Caetano uma postura politicamente mais engajada.

O contexto da época: Em 1977, o Brasil ainda estava sob o regime militar. O presidente era Ernesto Geisel, que prometia uma chamada “abertura lenta, gradual e segura” como forma de transição para um futuro governo democrático.

Não obstante, em 1º de abril de 1977, o Brasil acordou sem Congresso Nacional. O presidente Geisel se valeu do Ato Institucional 5 (AI-5), que não era usado desde 1969, para colocar o Parlamento em recesso, anunciando, no mesmo mês, um conjunto de medidas conhecido como Pacote de Abril, composto por uma emenda constitucional e seis decretos, tudo isso para assegurar maioria na Câmara e no Senado à ARENA, partido do governo.

Neste contexto, o álbum teve uma repercussão negativa justamente por ser considerado “alienante”, pois sua proposta era dançante e sem engajamento político. Numa reportagem de Claudia Arrigoni, no Jornal do Brasil em, 1977, Caetano afirmou:


Passei 12 dias na Nigéria curtindo o Festival de Arte Negra. Agora vou lançar um disco para todo mundo dançar. Eu acho bacana essa coisa de dançar, gosto muito. Talvez eu não seria capaz de fazer esse tipo de música muito bem, mas pensando bem, esse não é um disco para dançar, só feito por alguém que gosta de dançar. Entendeu? Na África, as pessoas dançam e isso é bacana.

O show, em consequência do álbum se chamava Bicho Baile Show, numa clara alusão de que seria um espetáculo para as pessoas dançarem, no qual Caetano seria acompanhado da Banda Black Rio.

Mas a repercussão não foi positiva, como conta Paulo César de Araújo no Livro “Eu Não Sou Cachorro Não – Música Popular Cafona e Ditadura Militar

O caso Caetano Veloso é exemplar. Em 1977- ano em que os militares comemoravam os “13 anos da revolução” e que a sociedade civil protestava, o cantor lançou o LP “Bicho”, que indicava uma opção preferencial pelo prazer e trazia na faixa de abertura um quase manifesto: “Deixa eu dançar / pro meu corpo ficar odara…” Palavra do dialeto ioneba (africano), odara, segundo o próprio Caetano, significa “estar bem”, “sentir-se feliz.

Nas entrevistas à imprensa o artista dizia que não tinha maiores interesses por assuntos políticos e reiterava que aquele era um disco “de quem gosta de música para dançar”. Aí é que estava o problema. “Dançar, nesses tempos sombrios?”, indagava a jornalista Ana Maria Bahiana. Um outro jornalista, indignado, afirmava que Caetano “não tinha o direito de pôr uma roupa colorida e sair brincando por aí, dizendo que está tudo bem, isso é oba-oba inconsequente

O ápice do patrulhamento ocorreu durante a temporada do espetáculo Bicho Baile Show, no qual Caetano era acompanhado pela Banda Black Rio – grupo carioca que propunha a fusão do samba com elementos do jazz, soul e funk. A jornalista Margarida Autran dizia que “o artista não pode alienar-se da realidade que o cerca” e que por isso Caetano Veloso não tinha o direito “de não ler jornais, de declarar publicamente nada saber do que se passa em termos políticos – no Brasil e no exterior e, consequentemente, de apresentar um espetáculo como o que está em cartaz no teatro Carlos Gomes, irresponsavelmente ‘feito para dançar’. E que, afinal, nem para dançar serve”. Ela concluía afirmando que ao seguir o rastro do sucesso da Banda Black Rio, o show de Caetano não passava de uma “oportunista e malsucedida incursão ao alienado clima que hoje embala os subúrbios cariocas”.

Vale a pena citar trechos de algumas reportagens sobre o tema:

Luís Carlos Cabral – Revista POP (1977) – Não acredito que Bicho gerasse tanta controvérsia se tivesse sido editado em época de maior silêncio geral. A geral, porém, se agita, e precisa de solidariedades unânimes. Brasil à parte, o poeta Caetano Veloso continua exercitando a sua fina sensibilidade,

Maria Helena Dutra (Jornal do Brasil) – “Afastemos, porém, e outra vez, das ciladas de discutir e refletir sobre conteúdos porque afinal esse show foi feito para esquecer, já que não atinge mesmo sua desejada finalidade de ‘feito para dançar'(…) Parodiando o exímio artista da palavra, o sempre gostável e também senhor Caetano Veloso em sua música Tigresa: ‘As garras do artista Caetano nos marcaram o coração. Mas as besteiras de menino que ele disse, não’.”

Jary Cardosos (Folha de São Paulo)O baiano não esperava uma agressividade tão grande por parte dos críticos em relação às suas propostas dançarinas (‘O certo é dançar’, diz uma de suas músicas) e ‘alienantes’ (o que ele não concorda).

Esta Patrulha ideológica contra Caetano tinha na Canção Odara seu símbolo maior: uma canção livre, leve e solta, certamente inspirada na viagem que Caetano e Gil fizeram a Lagos, na Nigéria, para participar do II Festival Mundial de Artes e Cultura Negra (Festac). Então, se trata de uma música para cima, alto-astral, que cultua o prazer. Caetano, sobre a canção, falou ao Jornal do Brasil : “Quando comecei a gravar o disco, estava convencido de que Odara era a mais bonita das canções que tinha feito ultimamente. Até hoje, ainda não encontrei bons argumentos em contrário

Mas a patrulha ideológica foi implacável: caetano, preso durante a ditadura e exilado, não teria o direito de cantar a felicidade. Teria um dever de engajamento. Luciana Xavier de Oliveira, no seu escrito “Disputas ideológicas, cultura negra e jornalismo cultural: a crítica musical carioca e os bailes de soul dos anos 1970”, pondera:

O debate em torno das patrulhas ideológicas se refere a um momento muito particular dos anos 1970, em que intelectuais e formadores de esquerda deliberadamente passaram a cobrar uma arte engajada, criticando manifestações que não se enquadrassem em um viés de contestação política. As patrulhas ideológicas estabeleciam claramente uma distinção de valor entre “músicas para dançar” e “músicas para pensar”. Caetano denunciava os cadernos de cultura dos principais jornais e revistas do país, que seriam dominados por uma esquerda repressora representada por críticos que pretendiam policiar a música popular no Brasil. Se os próprios integrantes da MPB poderiam ser criticados por produzir canções e discos que privilegiassem a festa, a alegria, o ritmo e a dança, o que dirá de todo um movimento periférico, popular, baseado em bailes, nos quais se ouvia e se dançava música americana? Risério (1981, p. 32) ainda complementa: “Pior ainda é que esses setores supostamente ‘progressistas’ falavam em nome das massas oprimidas do país exatamente para condenar uma das manifestações estéticas e sociais mais vivas dessas mesmas massas oprimidas.

Paulo César de Araújo prossegue:

Como se vê, mais do que a música em si, os críticos analisavam as atitudes, as opiniões, os posicionamentos políticos de Caetano e Gil. Contra isso insurgiu-se Caetano Veloso numa polêmica entrevista ao Diário de São Paulo. Ali ele afirmou que os cadernos de cultura dos principais jornais e revistas do país eram dominados por uma “esquerda medíocre, de baixo nível cultural e repressora” que pretendia policiar “essa força que é a música popular no Brasil”. E Caetano exemplificava citando nominalmente quatro críticos musicais: Tárik de Souza, José Ramos Tinhorão, Maurício Kubrusly e Maria Helena Dutra, que, segundo ele, distribuíam estrelinhas a discos e shows “fingindo que estão fazendo um trabalho da revolução operária, e se acham no direito de esculhambar com a gente, porque se julgam numa causa nobre; quando não tem nobreza nenhuma nisso“.

Para Caetano, seus críticos não tinham autoridade para questionar nenhuma atitude dele porque “são pessoas que obedecem a dois senhores: um é o dono da empresa, o outro é o chefe do partido” e que por isso eles se expressariam numa “linguagem completamente esquizofrênica”, de difícil assimilação para o leitor.

Ninguém entende os artigos que os imbecis escrevem porque é uma mistura de Roberto Marinho e Luiz Carlos Prestes.” Chamando a crítica militante de “canalha”, Caetano dizia que “se eles não se tornarem uma União Soviética e mandarem me matar, não conseguirão jamais nada comigo, a não ser que eles ganhem os tanques. Se eles tiverem os tanques nas ruas, nas mãos deles, aí eles poderão me impedir em alguma coisa. Fora isso, é impossível” porque “eles não são de nada. É uma canalha que eu digo que vou acabar, que a gente já acabou, já matou, são defuntos que fingem que estão vivos”.

Na contramão da crítica, Tarso de Castro afirmou em 31 de julho de 1977: Mas é realmente formidável que agora se esteja vivendo o repeteco das perseguições a Caetano Veloso. Ah, que belos críticos temos: se não se especializaram em música são totais admiradores do próprio fascismo. (…) Falemos de uma coisa boa: ‘Bicho’, de Caetano Veloso, é um disco lindo, limpo, de uma correção assustadora, irritante“.


Mais tarde, em 1991, Caetano Veloso, em reportagem de Marcia Cezimbra no Jornal do Brasil, apontava: Odara é uma confissão de namoro com as discotecas. Eu me sentia bem em me aproximar do movimento Black Rio que surgia na época, quando começaram os grandes bailes funks. Tinha voltado de uma excursão na África com o Gil, onde tive contato com a juju music da Nigéria. É um disco histórico, porque traz pela primeira vez a juju music para o Brasil em Two naira fifty kobo, que era o preço que a gente mais ouvia na Nigéria e o apelido do motorista que nos acompanhava. Fiz a música pensando no motorista. Tem Um índio, com uma levada reggae. Tem Leãozinho, deslumbrante. Uma vez fui cantar numa assembleia não sei de quê na Associação Brasileira de Imprensa (ABI). Ia fazer um número para animar as pessoas, igual ao dessas, cantoras que cantam para os soldados na guerra, e recebi um bilhete de que levaria porrada se cantasse Leãozinho. Na hora ia cantar, mas fiquei com medo. Nem sabia direito que manifestação era aquela. Foi um amigo que me pediu para ir. Tem Tigresa, que cita na letra a discoteca Dancin’ Days, uma boate do Nelson Motta que eu adorava. Aliás, eu encontrava muito desses críticos de esquerda dançando nas discotecas.”

O tempo terminou fazendo com que Bicho, a despeito de todas as críticas, permanecesse. Não sei se poderia ser considerado propriamente um disco dançante. muitas de suas canções são canções para serem ouvidas. Talvez “Odara” e “Gente” seriam as músicas mais dançáveis. Mas, por outro lado, clássicos permaneceram, e “Leãozinho”, “Tigresa” , “Alguém Cantando” permanecem no repertório dos shows de Caetano até hoje.

Fontes:

Paulo César de Araújo: Eu Não Sou Cachorro Não – Música Popular Cafona e Ditadura Militar Record, 2010  

Agência Senado (https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2017/03/31/ha-40-anos-ditadura-impunha-pacote-de-abril-e-adiava-abertura-politica#:~:text=H%C3%A1%2040%20anos%2C%20ditadura%20impunha%20Pacote%20de%20Abril%20e%20adiava%20abertura%20pol%C3%ADtica,-Compartilhe%20este%20conte%C3%BAdo&text=No%20dia%201%C2%BA%20de%20abril,colocar%20o%20Parlamento%20em%20recesso.)

Luciana Xavier de Oliveira – Disputas ideológicas, cultura
negra e jornalismo cultural: a crítica musical carioca e os bailes de soul dos anos 1970

https://www.ibahia.com/caetano80anos/caetano-80-anos-veja-criticas-de-cinco-albuns-do-icone-da-mpb

 

Fogueira: De Ângela Ro Ro para Zizi Possi

Histórias de amor deixam marcas e músicas. Algumas músicas, como algumas histórias de amor, são óbvias e não possuem muita coisa de especial. Outras músicas marcam, ficam definitivamente marcadas, como certas e especiais histórias de amor.

Toda história verdadeira de amor tem sua canção ou sua trilha sonora, e sorte de quem consegue traduzir numa bela letra, harmonia e melodia os encantos e desencantos do amor vivido.

Falo isso para analisar uma das músicas mais belas, senão a mais bela, gravada por Ângela Ro Ro. Esta música é Fogueira, cuja letra segue abaixo.

Por que queimar minha fogueira?
E destruir a companheira
Por que sangrar o meu amor assim?
Não penses ter a vida inteira
Para esconder teu coração
Mas breve que o tempo passa
Vem num galope o teu perdão

Porque temer a minha fêmea?

Se a possuis como ninguém
A cada bem do mal do amor em mim
Não penses ter a vida inteira
Para roubar meu coração
Cada vez é a primeira
Dou fé também serás ladrão

Deixa eu cantar
Aquela velha história, o amor
Deixa penar, a liberdade está também na dor

Eu vivo a vida a vida inteira
A descobrir o que é o amor
Leve pulsar do sol a me queimar
Não penso ter a vida inteira
Pra guiar meu coração
Sei que a vida é passageira
E o amor que eu tenho não!

Quero ofertar
A minha outra face à dor
Deixa eu sonhar com a tua outra face, amor

 A música foi composta para Zizi Possi, com quem Ângela vivia um romance (ambas moravam juntas), e algumas histórias não bem esclarecidas fizeram com que o romance terminasse. As fontes – nem sempre confiáveis – dão conta de que Ângela teria sido acusada de agredir Zizi, outra, que Ângela teria feito um escândalo num show de Zizi, a ponto de precisar ser retirada pela polícia do teatro onde Zizi se apresentava.

Numa entrevista, Angela Afirmou:

“Eu nunca bati em ninguém nem naquela cantora em 1981. Nunca dei um tapa nela e nem ela em mim. E até hoje eu carrego essa cruz de infâmia e calúnia”, contou, em entrevista ao portal ‘Gay Blog’.

“Admiro muito o canto dela, quero o bem dela, não desejo mal nenhum. Foi imperdoável e continua sendo a omissão. Ela simplesmente poderia ter dito a qualquer hora, desde aquele ano até hoje: ‘Olha, a Ro Ro nunca me bateu’. Não custava nada”, continuou.

“Ela calou, e quem cala consente. Eu fiquei com essa má fama, mas só acredita nessa fama quem não presta”, finalizou a cantora

Uma situação, que causou mais impacto, foi quando, após o rompimento, Ângela compareceu a um show de Zizi. Na voz de Ângela:

Mandei comprar ingressos e fiquei em casa, com o meu amigo Claudio conversando e bebendo vinho. Como tivesse sobrado meia garrafa, botamos na mochila dele e saímos. Quando entramos no teatro, as luzes já estavam apagadas. Sentamos, no maior silêncio. Mas comecei a participar do espetáculo, como uma espectadora comum que estivesse adorando o que se passava no palco, cantei junto, aplaudi e gritei “Zizi Possi, eu te amo!”. Acontece que eu sou extrovertida e essa é minha maneira de opinar, tanto para elogiar quanto para protestar. A primeira parte do show terminou com My sweet lord que eu adoro e cantei interinha, do meu lugarzinho. foi quando as luzes se acenderam para o intervalo.”  

No entanto, esta interferência não teria agradado Zizi, que, segundo a mídia da época, teria retrucado:

 “Eu gostaria muito que você entendesse…Usasse toda a sua inteligência e percebesse que é com você que eu estou falando agora. As suas vibrações me incomodam, sua presença me perturba… Você nunca me ajudou, por favor não me atrapalhe, não se interponha em minha vida pois você não me é mais uma pessoa querida. Levanta, levanta por favor vai embora! Levanta, saia do teatro agora! Eu preciso de paz pra tocar e cantar!”

Ângela acabou sendo retirada do Teatro pela polícia. Disse ter sido traída:

Zizi me traiu. e quando falo em traição, não me refiro a infidelidade. Traição é aquilo que Tiradentes sofreu e eu, que não sou dada a usar coroas de espinhos, não estou afim de entrar nessa… mas não esquento não. Nunca vi um monte de formigas derrubar Gibraltar, a ambição dessa mulher, de ser Sara Bernhardt, já esta quase preenchida, falta chegarmos ao tribunal. Aí sim, a pobre moçoila seduzida pela terrível bêbada e perigosa homossexual”

O fato é que a mídia da época, no início dos anos 80, tratava a relação de ambas como um tabu, sendo feitas diversas referências preconceituosas sobre a homossexualidade.

 As razões do rompimento são questões menores e que devem ficar para as revistas de fofocas. O fato é que Ângela fez uma música confessional, uma declaração de amor e de incredulidade por alguém que está magoando o eu lírico, alguém que está machucando, se escondendo, decepcionando um amor profundo, mas que, apesar de tudo, o amor resiste.

 É uma canção que oferece um perdão em nome do amor, que tenta dizer que nem sempre haverá outra oportunidade para vivê-lo e ganhá-lo a cada revés, mas que ao mesmo tempo se contradiz, dizendo ser o amor eterno, não passageiro, que está sempre disposto a perdoar se o objeto do sentimento puder, ainda que brevemente, estender a mão.

 “Fogueira” foi gravada também por Bethania em 1983, mas seu caráter absolutamente confessional a faz mais bonita quando interpretada por Ângela Ro Ro, cuja voz rouca e o estilo de cantar lembra um pouco a cantora Maysa (e a intensidade dos sentimentos, também).   

 Essa musica foi gravada no seu terceiro LP, “Escândalo”, de 1981, título de uma das músicas do LP, de autoria de Caetano, como que uma tradução daquele momento em que vivia a cantora, logo após a separação de Zizi Possi, ocorrida de modo traumático e coberta do modo naturalmente sensacionalista pela imprensa da época.   

 A capa do disco traz o nome “escândalo” como se fora uma manchete de jornal, parodiando as notícias escandalosas que saíram na imprensa por conta de seu rompimento com a cantora Zizi Possi.

 Muitos anos depois, em entrevista ao Jornal “Gazeta do Povo”, Ângela esclareceu:  

  Não quero ser indelicado, mas o desafeto com a Zizi Possi continua?

Com a Zizi Possi? Não há o menor desafeto. Eu tive uma profunda tristeza da gente. Ela e eu fomos vítimas de manipulações, de más línguas. As pessoas foram muito maliciosas. Muita maldade, muita truculência física e psicológica contra mim. Eu nunca bati em ninguém, muito menos na Zizi e ela sabe disso. Eu acho a Zizi uma pessoa muito bacana. Nunca mais fizemos amizade. Ela tem uma filha linda que canta tão bem quanto ela. Zizi é uma grande artista. Pena que nunca mais fizemos amizade porque eu poderia pedir dinheiro emprestado a ela, né?

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A briga de Beth Carvalho com Elis Regina por conta de “Folhas Secas”

“Folhas Secas” é uma das maiores composições de Nelson Cavaquinho, em parceria com Nelson Antônio da Silva e Guilherme de Brito. Está na história do cancioneiro nacional. Trata-se de uma homenagem à Estação Primeira de Mangueira, música cantada num tom nostálgico, em que o eu-lírico, ao pisar em folhas caídas de uma mangueira, se lembra da sua escola, na qual, por inúmeras vezes, subiu o morro cantando…

Em seguida, vem um anúncio de um tempo em que a velhice vem chegando e que o cantor não poderá mais cantar, mas sentirá saudade de seu violão e da sua mocidade, e uma frase que tem um duplo sentido “e assim vou me acabando…”, de cantar? Ou será que tem a ver com o envelhecimento?

O fato é que a canção rendeu muitas polêmicas, e não por conta de sua letra. Sua gravação é que gerou polêmicas. Na verdade, Elis Regina e Beth Carvalho gravaram a música no mesmo ano (1973). A versão de Beth, um samba, com direito a “laraiá” e tudo; a versão de Elis é quase um samba-canção, com uma interpretação mais intimista e com um andamento mais lento.

Três livros contam versões diferentes sobre o tema:

Na biografia de Elis escrita por Arthur de Faria, consta que Elis teria ouvido a canção na fita que Beth Carvalho enviara a César Camargo Mariano e teria “pulado na frente”;

Cumpre ressaltar que César era quem faria os arranjos do disco de Beth Carvalho, mas casaria com Elis naquele ano (1973).

Danilo Casaletti, no livro organizado por Célio Albuquerque (1973 – O ano que reinventou a MPB), conta que César teria mostrado para Elis, ao piano em casa, a canção em que estava trabalhando para o disco de Beth. Elis teria ficado encantada e pediu a música para Nelson Cavaquinho. O compositor, mesmo já tendo prometido a faixa a Beth, foi incapaz de dizer “não” ao pedido – sobretudo pelo fato de que Elis tinha mais destaque, por ser contratada de uma grande gravadora (Philips).

Sérgio Cabral, na Biografia que escreveu sobre Tom Jobim, conta que César Camargo ouvia a fita em casa, com a voz de Nelson Cavaquinho, tentando elaborar o arranjo para o disco de Beth. Elis escutou e não pensou duas vezes: “Que Beth Carvalho, que nada! Este samba vai para o meu disco”.

Mas quem terminou por trazer novas luzes sobre o tema foi Leonardo Bruno, no livro Canto de rainhas – O poder das mulheres que escreveram a história do samba. E quem assumiu a responsabilidade foi Roberto Menescal, compositor e produtor do disco de Elis.

    No epicentro do terremoto estava César Camargo Mariano, amigo que Beth havia convidado para fazer o arranjo do compacto Só quero ver, em 1971, e que chamou novamente para a produção de Canto para um novo dia. Na seleção de repertório para o no LP, Beth escolheu a canção de Nelson Cavaquinho e mostrou a César. O que Beth não sabia era que ele estava namorando Elis Regina. Pouco tempo depois, Beth descobriu que o disco Elis, que seria lançado pela Philips, traria “Folhas secas”. A sambista ficou furiosa. Apressou sua gravação da canção e pediu à Tapecar que colocasse no mercado um compacto simples com o registro, o que foi feito com velocidade razoável.

    Mas as “Folhas secas” de Elis chegaram primeiro as rádios, com formação de jazz (piano-baixo-bateria) e uma percussão suave, numa interpretação mais lenta. As de Beth vieram logo depois, com a instrumentação mais tradicional de samba, abertura com direito a “laralaia”, andamento mais pra frente e acompanhamento do conjunto nosso samba. Ambos os arranjos são de César Camargo Mariano.

    As duas versões fizeram sucesso radiofônico. Mas a que entrou para a história foi mesmo a gravação de Beth Carvalho, até por ter na faixa o violão de Nelson Cavaquinho, em seu estilo peculiar, tocado com apenas dois dedos. O curioso é que Nelson também lançou um disco no mesmo ano de 1973, considerado o melhor de sua carreira, e resolveu incluir “Folhas secas” – que, no fim das contas, teve três registros memoráveis num espaço de poucos meses.

    Mas, afinal, como a música escolhida por Beth foi parar no disco de Elis? Há algumas versões para a história, e um consenso de que a ligação de César Camargo Mariano com Elis foi o caminho para que a fita chegasse aos ouvidos da Pimentinha.

        A versão de Beth Carvalho é que ela adorava o trabalho de César Camargo e achou natural convidá-lo para fazer os arranjos e a regência do novo disco. Escolheu o repertório e mandou para ele numa fita de rolo. Tempos depois, ouviu o boato de que Elis Regina teria gravado “Folhas secas” e telefonou para o músico, que negou. Mas o zum-zum-zum foi aumentando. Nesse meio tempo, encontrou César no trânsito, emparelhados num sinal. Abriu a janela e perguntou: Ô, César, qual é o nome da música do Nelson Cavaquinho que a Elis vai gravar?” Ele disse que não se lembrava. Uma semana depois, uma jornalista prima de Beth, que entrevistara Elis, tirou a dúvida: a Pimentinha havia gravado “Folhas secas”. Elis não me deu nenhuma satisfação por isso. Fiquei muito chateada, nunca mais falei com ela”, contou Beth. O rompimento com César Camargo também durou mais de uma década.

    Beth Carvalho deixou evidente seu desagrado com o episódio quando foi lançar o disco no Sambão, da TV Record, programa apresentado por Elizeth Cardoso, uma das “rivais” de Elis. Ao ser anunciada para cantar “Folhas secas”, Beth entrou no palco, pegou o microfone e, já com a banda dando a introdução da música, aproveitou para dar uma alfinetada: “Antes eu quero dar uma palavrinha. Essa música que eu vou cantar é de um compositor que eu adoro, Nelson Cavaquinho, em parceira com Guilherme de Brito. Mas antes de eu gravar, eu cantei essa música num teatro, e Elizeth Cardoso estava presente. Eu soube que ela adorou a música e queria gravar também. Mas quando ela descobriu que eu ia gravar, ela disse: ´Não, então se a Beth já vai gravar, mais tarde eu gravo; Por isso é que ela é a Divina Elizeth Cardoso! (vídeo abaixo)

    Em entrevista para este livro, Roberto Menescal dá uma nova versão, assumindo a responsabilidade pelo entrevero e de certa forma absolvendo César e Elis. Menescal, autor da primeira música gravada por Beth, “Por quem morreu de amor”, a esta altura era produtor de Elis Regina, e muito amigo do casal Elis-César Camargo. Além disso, atuava como diretor artístico da gravadora. “Eu fiz uma ´baianada` com a Beth. César era casado com a Elis e estava produzindo o LP da Beth Carvalho. Ele fez um arranjo da música ´Folhas secas’, do Nelson Cavaquinho, e me mostrou. Eu disse: Eu vou gravar essa música. O César falou: ´Não, Menescal, eu não posso fazer isso com a Beth. Respondi: ´Fala que fui eu que peguei a música. Fizemos um arranjo pra Elis e estouramos. Beth nunca me falou nada, mas deve ter ficado mordida. César ficou mal com a situação. Elis não sabia de nada. Depois eu mandei um recado pra Beth Carvalho: Beth, me desculpe, mas pelo meu artista eu faço qualquer coisa.’”

    Enfim, Roberto Menescal assumiu a responsabilidade pela polêmica que fez com que Elis e Beth Carvalho jamais se falassem de novo… Paulinho Lima, no seu livro, “Anjo do Bem, Gênio do Mal”, disse ter perguntado a Nelson Cavaquinho qual das gravações ele gostava mais. Ele, de forma relutante, disse: “A de Beth…”

Não prendam Nara Leão!

Dia 27 de maio de 1966 Carlos Drummond de Andrade publicou um poema contra um suposto desejo dos militares de que Nara Leão fosse presa depois de uma entrevista que ela deu na imprensa.

No dia 22 de maio de 1966, foi publicada uma entrevista da cantora, em que o título da matéria já falava por si. “Nara é de opinião: esse Exército não vale nada”. Não por coincidência, no mesmo dia, o mesmo jornal ostentava uma manchete do futuro presidente, o General Costa e Silva. “Costa e Silva: governarei com o povo”

Embora a manchete não correspondesse exatamente àquilo que Nara tivera dito na entrevista, ela já seria suficiente para causar estardalhaço: disse que os militares poderiam entender de canhões e metralhadoras, mas não de política; disse que o mundo seria melhor se não existisse exército; que numa guerra moderna, o Exército brasileiro não serviria para nada; e que um país desigual como o Brasil teria outras prioridades, como escolas e hospitais.

Segundo Tom Cardoso, na biografia que escreveu sobre Nara (Ninguém Pode com Nara Leão – ed. Planeta, 2021), o mudo teria caído sobre Nara. Os jornais teriam repercutido a notícia, e o pai da cantora, o advogado Jairo Leão, teria sido intimado a comparecer no Palácio Duque e Caxias, onde ficava o Ministério da Guerra. No entanto, ele teria dito a Mario andreazza, chefe de gabinete de Costa e Silva:

– Minha filha é maior de idade e livre para dizer o que pensa

Não foi convencido, portanto, a fazer Nara desmentir o que dissera ao Jornal.

No entanto, já circulava na imprensa boatos de que o governo pretendia enquadrar Nara leão na Lei de Segurança Nacional e que ela poderia ser presa. Havia pressão da linha mais dura do Exército no sentido de que a suposta afronta não ficasse impune.

Segundo a biografia de Nara escrita por Sérgio Cabral (Lazuli, 2000), o serviço secreto do Ministério da Guerra, temendo a repercussão da entrevista, sugeriu três alternativas a Costa e Silva, Ministro da guerra e futuro presidente do Brasil:

a) o próprio exército responder ao artigo, “focalizando a atuação do exército na conjuntura do país”

b) responder indiretamente, por meio de artigo em que se focalizasse a atuação do exército “através de articulista identificado com a revolução”

c)verificar os antecedentes de Nara Leão e difundir na imprensa.

Havia, no entanto, rumores de que setores mais rigorosos do exército recomendariam a prisão imediata de Nara Leão.

O Jornal do Brasil ,em editorial, afirmou que nara teria sido vítima “da extravagância de um repórter”

Ibrahim Sued, conhecido colunista da época, insinuou que Nara estaria sendo “joguete da esquerda festiva”, estaria fazendo declarações que seus “mentores não teriam coragem de fazer”. E ainda afirnou que ela “como talento não era lá grande coisa”.

Do outro lado, diversos artistas prestaram solidariedade a Nara, como Edu Lobo, Fernanda Montenegro, Mario Lago, Ferreira Goulart, Tonia Carrero, Flavio Rangel, João do Vale e Odete Lara. Foi feito um abaixo-assinado contra a prisão de Nara, com assinaturas de mais de 150 artistas.

Além disso, teve manifestações públicas favoráveis na imprensa de Rubem Braga, Millôr Fernandes, Stanislaw Ponte Preta, entre tantos outros.

Moacyr Werneck de Castro mandou um blilhete a Nara: “Você é uma menina de atitudes claras. Deus a conserve assim. Você tem uma visão geral das coisas e por isso sua aceitação pelo público não está na dependencia dos caprichos moda. O Brasil precisa de você, que não é boneca de microfone, mas pensa nos problemas da arte”

No entanto, o mais conhecido manifesto contra a prisão de Nara Leão veio de ninguém mais, ninguém menos que Carlos Drummond de Andrade. O poeta publicou um poema no Correio da Manhã, no dia 27 de maio de 66:


  APELO
(excerto)

“Meu honrado marechal
dirigente da nação,
venho fazer-lhe um apelo:
não prenda Nara Leão (…)

A menina disse coisas
de causar estremeção?
Pois a voz de uma garota
abala a Revolução?

Narinha quis separar
o civil do capitão?
Em nossa ordem social
lançar desagregação?

Será que ela tem na fala,
mais do que charme, canhão?
Ou pensam que, pelo nome,
em vez de Nara, é leão? (…)

Que disse a mocinha, enfim,
De inspirado pelo Cão?
Que é pela paz e amor
e contra a destruição?

Deu seu palpite em política,
favorável à eleição
de um bom paisano – isso é crime,
acaso, de alta traição?

E depois, se não há preso
político, na ocasião,
por que fazer da menina
uma única exceção? (…)

Nara é pássaro, sabia?
E nem adianta prisão
para a voz que, pelos ares,
espalha sua canção.

Meu ilustre marechal
dirigente da nação,
não deixe, nem de brinquedo,
que prendam Nara Leão.”

Carlos Drummond de Andrade

Depois de tanta manifestação, o governo recuou. Mem de Sá, Ministro da Justiça, disse que não enquadraria Nara na Lei de Segurança Nacional, embora considerasse seus comentários “atrevidos” e o seus conceitos “injustos”

Nara não se fez de rogada Na biografia de Nara escrita por Sérgio Cabral, consta que Nara consultou Ferreira Goulart e recebeu desta a recomendação de não fazer novas declarações contra os militares. Disse que estava exausta e não tinha vocação para Joana D’arc. Disse que tudo aquilo valeu a pena pela inspiração a um de seus poetas preferidos.

Deus, o Diabo, o carnaval e a censura

Em 1973, a censura fazia parta do cotidiano dos artistas brasileiros. Depois do AI-5, decretado em 13 de dezembro de 1968, institucionalizou a censura, vetando, mutilando e reprimindo qualquer manifestação que pudesse ser interpretada como sendo nociva ao Regime.

Mas se engana quem pensa que a censura se limitava a questões político-partidárias. Havia censura por questões morais, por questçoes de “bom gosto” ou até mesmo por ignorância, pura e simples.

Uma das canções que pode ilustrar como a atuação da censura no Brasil, para além do alinhamento com a ditadura militar, beirava o moralismo ou mesmo a paranoia é a marcha carnavalesca, “Deus e o Diabo”, de Caetano Veloso, composta em 1973, mas somente gravada em 1977.

A música é uma ode ao carnaval. Uma marcha simples, que alude ao carnaval como antítese do medo e do pavor, e que se manifesta nas ruas do Rio e da Bahia.

Você, tenha ou não tenha medo

Nego, nega, o carnaval chegou

Mais cedo ou mais tarde acabo

De cabo a rabo com essa transação de pavor

O carnaval é invenção do diabo

Que Deus abençoou

Deus e o diabo no Rio de Janeiro

Cidade de São Salvador

Não se grile

A rua Chile sempre chega pra quem quer

Qual é! qual é! qual é!

Qual é! qual é!…

Quem pode, pode

Quem não pode vira bode

Foge pra Praça da Sé

Cidades maravilhosas

Cheias de encantos mil

Cidades maravilhosas

Os pulmões [bofes] do meu Brasil

No entanto, a música incomodou a censura No livro “Mordaça: Histórias de Música e censura em tempos autoritários” (João Pimentel e Zé McGill. Sobnora, 2021), narra-se um pouco do episódio:

Voltando ao tempo das vacas gordas da censura, em 1973, a marchinha “Deus e o Diabo” foi outra composição de Caetano a gerar atrito com os censores, que muitas vezes se colocavam na condição de educadores, tutores da sociedade – como se esta fosse uma criança indefesa que precisa ser protegida da realidade. A música foi vedada e, no verso do documento oficial com o parecer do censor, há a seguinte justificativa:

  1. Conteúdo desrespeitoso à imagem da pátria (por conta do verso ´Dos bofes do meu Brasil`);
  2. Figura semântica insurrecional (´A Rua Chile sempre chega pra quem quer`);
  3. Possível distorção da pronúncia em ´Quem pode, pode.”

Além da justificativa, estão marcados com um X os versos “Dos bofes do meu Brasil”, “A rua Chile sempre chega pra quem quer” e “O carnaval é a invenção do Diabo que Deus abençoou”.

Neste último caso, não é difícil supor que o verso tenha se tornado antipático aos censores por motivos de religião. Já no verso da rua Chile, a suposta “figura semântica insurrecional” estaria ligada ao fato de que a ditadura de Pinochet havia se instalado no Chile no mesmo ano de 73. Por tanto, o censor julgava que aquela seria uma metáfora em alusão à insurreição contra a ditadura chilena. Quanto à “possível distorção da pronúncia” em Quem pode, pode”, podemos presumir que havia um receio de que, na gravação, Caetano contasse o verso no passado, mudando a conjugação do verbo de “pôde”, ou, quem sabe, trocando a letra p pela letra f…

Nota-se, também os grifos aos versos “mais cedo ou mais tarde acabo com essa transação de pavor”, o que pode ser uma alusão ao fim da ditadura militar.

Manchete de O Globo, 21/12/73

Voltando ao Livro de João Pimentel e ZÉ McGill:

Conversando sobre a censura a “Deus e o Diabo”, Caetano se lembra do contratempo com a palavra “bofes”, mas não com os outros versos: “Eles falaram que não poderia ficar o verso Os bofes do meu Brasil; e eu disse:Mas bofe quer dizer pulmão. Eu estou dizendo que são os pulmões do Brasil.Eles achavam que “bofe” era uma palavra chula. As atrizes de teatro rebolado chamavam os homens, os caras que elas pegavam, de bofes e as bichas adotaram essa gíria das vedetes. Eu botei Os bofes do meu Brasil’ na letra, que tem um ar de conversa de bicha, mas, ao mesmo tempo, era porque eu estava dizendo: Rio de Janeiro/Cidade de São Salvador/ os pulmões do meu Brasil. Então, eu falei: Se vocês estão grilados com a palavrabofes, eu boto pulmões’ mesmo... E tem uma vantagem: do ponto de vista da prosódia, pulmões’ fica até melhor, porquebofestem um defeito de prosódia. Sobre os outros versos nunca me disseram nada. Pode ser que eles tivessem essas questões lá entre eles, mas nunca chegarem até mim. Só chegou o bofe. Eu mudei pra pulmões’ e a música foi liberada. Agora, ´O carnaval é invenção do Diabo que Deus abençoou` é uma coisa subversiva para o lado católico que eles tinham, mas não me pediram pra mudar isso, não.”    

Ainda assim, segundo reportagem do Globo, de 30/12/73, ainda assim a expressão “pulmões” foi desaconselhada, porque eventualmente ela poderia ser substituída pelo populares por algum terno chulo… O censor certamente desconhece Salvador e a Rua Chile, umas das ruas famosas do circuito do carnaval baiano, sobretudo nos anos 70. O censor, todavia, pensava referir-se à situação política do Chile, quando o General Pinochet instituiu uma ditadura após a deposição de Salvador Allende, em detembro de 1973.

Mas a música acabou liberada com a substituição de “bofes” por “pulmões”, e foi gravada no álbum “Muitos carnavais”, em 1977

Revista Amiga 15/01/1974

Antonio Maria e Fernando Lobo e a polêmica parceria em “Ninguém me ama”

Antonio Maria e Fernando Lobo (Pai de Edu Lobo) eram amigos pernambucanos, radicados no Rio de Janeiro. Ambos eram compositores, jornalistas, radialistas. Eles tinham um acordo, segundo o qual eles cederiam reciprocamente a parceria em cada uma de suas músicas.

Antônio Maria E Fernando Lobo - Mpb - Lp - Vinil Ótimo | MercadoLivre

Assim, Fernando Lobo compôs “Preconceito”, que teve um sucesso bem modesto, mas consta a parceria com Antônio Maria.

Porque você me olha com esses olhos de loucura?
Por que você diz meu nome?
Por que você me procura?
Se as nossas vidas juntas
Terão sempre triste fim
Se existe um preconceito muito forte
Separando você de mim
Por que esse beijo agora?
Por que, meu amor, esse abraço?
Se um dia você vai embora
Sem passar os tormentos que eu passo
De que serve sonhar um minuto?
Se a verdade da vida é ruim
Se existe um preconceito muito forte
Separando você de mim

Pai de Edu Lobo e figura notável da música brasileira, Fernando Lobo nascia  há 100 anos | Viver: Diario de Pernambuco
Fernando Lobo

Antônio Maria, por sua vez, compôs um clássico do samba-canção de fossa: “Ninguém me ama”, e deu a parceria a Fernando Lobo.

Ninguém me ama, ninguém me quer
Ninguém me chama de meu amor
A vida passa e eu sem ninguém
E quem me abraça não me quer bem

Vim pela noite tão longa
De fracasso em fracasso
E hoje distante de tudo
Me resta o cansaço
Cansaço da vida, cansaço de mim
Velhice chegando
E eu chegando ao fim.

Ocorre que “Ninguém me Ama” fez um estrondoso sucesso. Ruy Castro, nos livros em que conta a história da Bossa-Nova, inclusive, chega a dizer que a Bossa Nova, com sua praia, mar, sol, barquinhos e leveza, era antítese dos sambas-canções dos anos 50, sendo que “Ninguém me Ama” seria o seu principal símbolo.

Antônio Maria, cronista maior da noite carioca, tinha lábia e porrada -  16/03/2021 - Ilustrada - Folha
Antonio Maria

Renato Vivacqua, pesquisador de música brasileira, conta :

(Fernando Lobo e Antonio Maria) Tinham feito um trato de que cada um cederia a parceria ao outro em determinada música. Fernando aterrissou como gracioso em “Ninguém me Ama” e Antônio entrou na composição “Preconceito” de Fernando. Acontece que “Preconceito” nem deu sinal de vida enquanto “Ninguém me Ama” estourou. Aí Antonio Maria deslumbrado pelo êxito, dedurou que o companheiro não tinha tido participação alguma na feitura da canção. Então foi zarabatana para lá e para cá.

Lobo declarou irônico: “Eu coloquei as vírgulas nos versos. Sou portanto o autor das vírgulas, mas isso só fica bem, dito por mim.”

Maria contra atacava: “A arrumadeira do hotel está indignada com Fernando Lobo. Todos os dias muda a roupa de cama e à noite Fernando deita a cabeça e suja tudo.

“Fernando: “Não estou rompido com Antonio Maria não. Apenas ele é muito gordo, tem muita banha. Afastei-me neste verão, por causa do calor…” Eis o pomo da discórdia:

Pesquisando na internet, achei uma notinha sobre o assunto no Jornal Correio da Manhã, do Rio de Janeiro, em 7 de maio de 1958:

PATERNIDADE — Chegamos à conclusão que o sr. Fernando Lobo é um homem injustiçado. Embora êle afirme que foi o autor de “Ninguém me ama”, todos atribuem n paternidade da música a Antônio Maria. Agora que Carlos Machado parece lançar, finalmente, nova produção baseada na “Viúva Alegre”, o sr. Fernando Lobo afirma ter sido êle o autor do musical. Parece que estão todos contra êle, “roubando” suas obras. A respeito comentou uma das “show-glrls” mais bonitas do elenco, Mariza Reynold: “E eu que pensava que o autor de “Viúva Alegre” havia sido Franz Lehar

Fontes: http://memoria.bn.br/pdf/089842/per089842_1958_19971.pdf

http://www.renatovivacqua.com/parceria-e-confraria-na-mpb/

“Você não gosta de mim, mas sua filha gosta”…. Jorge Maravilha, canção de Julinho de Adelaide (mas que é de Chico)

Julinho de Adelaide foi um personagem fictício que Chico Buarque criou na década de 70 para driblar a censura. Julinho da Adelaide nasceu quando Chico Buarque passou a ser muito conhecido entre os censores do regime militar, na década de 70. Seu nome estava marcado, e suas músicas eram proibidas somente porque Chico era o compositor.

Chico, então, criou um alter-ego, um heterônomo, um sujeito chamado Julinho da Adelaide, supostamente oriundo da fevela da Rocinha. Assim, Chico (ou melhor, Julinho) compôs três canções, em 1973/4, gravadas por Chico: Acorda, Amor (em que o eu-lírico diz para a mulher chamar o ladrão, pois a polícia está chegando), Jorge Maravilha e Milagre brasileiro (em que critica o chamado “milagre econômico”).

A vida curta e gloriosa de Julinho da Adelaide | Pega na Geral

Vou contar aqui um pouco da canção “Jorge Maravilha”, que tem um refrão bem conhecido “Você não gosta de mim, mas sua filha gosta”, que, segundo as lendas, seria um recado para a filha do então presidente do Brasil, Ernesto Geisel. 

No livro “História das canções”, Wagner Homem esclarece o fato: 

Para conseguir a liberação. Chico criou novo subterfúgio, que consistia em inserir a parte que lhe interessava misturada a outros tantos textos que não tinham pé nem cabeça. A canção foi enviada à Polícia Federal, sob o pseudônimo de Julinho da Adelaide, entre as estrofes abaixo:

A primeira parte não interessava:

Você não entendeu/Que o amor dessa menina/É a chama que ilumina/A minha solidão/O meu amor por ela/É uma cidadela/Construída com paz e compreensão

Aqui vinha a letra da que interessava:

E nada como um tempo após um contratempo
Pro meu coração
E não vale a pena ficar, apenas ficar
Chorando, resmungando, até quando, não, não, não
E como já dizia Jorge Maravilha
Prenhe de razão
Mais vale uma filha na mão
Do que dois pais voando

Você não gosta de mim, mas sua filha gosta
Você não gosta de mim, mas sua filha gosta

Ela gosta do tango, do dengo
Do mengo, domingo e de cócega
Ela pega e me pisca, belisca, petisca
Me arrisca e me enrosca

Você não gosta de mim, mas sua filha gosta
Você não gosta de mim, mas sua filha gosta

Depois, mais uma parte descartada:

E o meu amor por ela/É uma cidadela/Construída com paz e compreensão/Somente paz e compreensão/Para sempre paz e compreensão/E eu vou velar por ela/Como uma sentinela/Guardando paz e compreensão/Somente paz e compreensão/Paz sempre paz e compreensão

“Como não havia obrigação de gravar todo texto aprovado, as estrofes inicial e final foram simplesmente excluídas, restando o que de fato interessava.

Os intérpretes de entrelinhas logo vislumbraram na letra uma referência ao general Geisel, cuja filha, Amália Lucy, manifestara admiração pelas obras do autor.

O nascimento de Julinho da Adelaide – MÚSICA BRASILEIRA VIVA: A MPB na  linha de frente

Em entrevista a Tarso de Castro na Folha de S. Paulo, Chico revela a origem da imagem utilizada: “Aconteceu de eu ser detido por agentes de segurança, e no elevador o cara me pedir um autógrafo para a filha dele. Claro que não era o delegado, mas aquele contínuo de delegado”. Foram vãs as tentativas de esclarecimento, porque até hoje muita gente crê na interpretação fantasiosa.

Respondendo à mesma questão em 2007 para a revista Almanaque, ele diz:

Nunca fiz música pensando na filha de Geisel, mas essas histórias colam, há invencionices que nem adianta mais negar. Durante a ditadura, de um lado ou de outro, as pessoas gostavam de atribuir aos artistas intenções que nunca lhes passaram pela cabeça. Achavam que a maioria dos artistas só fazia música pensando em derrubar o governo. Depois da ditadura, falam que o artista só faz música para pegar mulher. Mas aí geralmente acontece o contrário, o artista inventa uma mulher para pegar a música.

Nesse ponto, a letra contém vários subterfúgios para burlar a censura:

a) o pretexto de um diálogo entre o eu-lírico e o pai da filha com quem o sujeito mantém uma relação bem física (aliás, segundo a letra, mais vale uma filha na mão do que dois pais voando);

b) A letra com cacos não utilizados no começo e no final;

c) A composição com o pseudônimo Julinho da Adelaide;

A música passou pela censura e foi gravada. Em 1975, uma  matéria sobre censura publicada no Jornal do Brasil revelaria que Julinho da Adelaide e Chico Buarque eram a mesma pessoa. Por causa dessa revelação, o serviço de censura do Governo Militar passou a exigir cópias do RG e do CPF dos compositores.

segunda 26 janeiro 2015 20:02 , em As lendas

Canção da despedida. A única parceria de dois Geraldos (Vandré e Azevedo)

Poucos sentiram tão fortemente o peso da ditadura militar como Geraldo Vandré. E a maior responsável por isso foi sua canção “Pra não dizer que não falei de flores”, ou “Caminhando”, apresentada no III Festival Internacional da Canção, no dia 29 de setembro de 1968. A canção ficou em segundo lugar (perdeu para Sabiá, de Chico e Tom Jobim, que receberam a maior vaia de suas vidas), mas foi cantada e recantada pelo público e chamada como a “Marselhesa Brasileira”. 

O certo é que, após o sucesso estrondoso de “Caminhando”, um verdadeiro hino contra a ditadura, a vida de Vandré tornou-se um martírio. Para se ter uma ideia, Zuenir Ventura faz uma referência a um artigo revoltado de um General, publicado no Jornal do Brasil em 06 de outubro de 1968, com o militar dizendo que a final do Festival da canção contemplara 3 injustiças:

1. Do Júri, ao colocar a música em segundo lugar, desconsiderando a “pobreza” da letra com seus gerúndios e rimas terminadas em “ão”, sem falar da canção em dois acordes.

2. Do público, que vaiou “Sabiá”

3. De Geraldo Vandré, que se insurgira contra “soldados armados”. Mas neste caso o general dizia que apenas essa terceira injustiça poderia ser reparada. 

Geraldo Vandré: o último show e a volta silenciosa
Vandré

No Jornal Estado de São Paulo de 05/08/1995, consta que Geraldo Vandré teria rompido com o Trio Marayá, que cantou com ele no Festival da Canção de 1968, e montou um novo grupo para acompanhá-lo numa turnê: o Quarteto Livre, do qual Geraldo Azevedo fazia parte do grupo.

Antes mesmo da canção “Caminhando” ser proibida oficialmente no dia 23 de outubro de 68, os discos já eram apreendidos, e Vandré vivia na paranoia de ser preso. Medo que se intensificou na sexta feira 13 de dezembro de 1968, quando veio o AI-5, uma das passagens mais vergonhosas da nossa história, que fechava o congresso, suprimia garantias individuais (como o habeas corpus) e fazia com que a ditadura mostrasse sua faze mais horrenda.

Vandré é advogado, e sabia dos riscos que corria, passou a esconder-se, viver na clandestinidade, mesmo sem saber se ele seria preso ou não, e, como relata Dalva Silveira, no seu livro “Geraldo Vandré: A vida não se resume em festivais (FT Editora), ele passou a planejar a fuga para um autoexílio.

Mas, antes de fugir do Brasil, Vandré passou um tempo escondido com ajuda da viúva de Guimarães Rosa. 

No período em que estava foragido, uma das pessoas que tinha acesso a Geraldo Vandré era Geraldo Azevedo, que compunha o “Quarteto livre”, banda que o acompanhara na turnê do Show “pra não dizer que não falei de flores”, cujo título, censurado, passou a ser “Socorro – a poesia está matando o povo”. 

Tarati Taraguá: Geraldo Azevedo - Jornal Nossa Música (1983)
Geraldo Azevedo

Geraldo Azevedo disse que, para ver Vandré, tinha que se comportar “como um militante de organização clandestina; entrava num carro, mudava para outro, fazia tudo para despistar pessoas da repressão que pudessem estar me seguindo para, por meu intermédio, chegar a Vandré” 

Nesse clima compuseram em parceria, Vandré e Azevedo, a “Canção da Despedida”, cuja letra é absolutamente clara e explícita. 

O eu-lírico anuncia sua despedida do seu amor, anunciando, todavia, seu futuro retorno. Afirma não poder ficar tendo em vista que um Rei mal coroado (que vem a ser, obviamente o governo militar) não deseja o amor em seu reinado.

No entanto, ao mesmo tempo em que se despede, anuncia a morte do “rei” velho e cansado, ao mesmo tempo em que anuncia a permanência do amor de hoje.  

 Obviamente, a música foi censurada. Numa entrevista para o site (www.abarriguda.org.br), Geraldo Azevedo conta:

Eu fui censurado várias vezes, teve uma canção minha que foi censurada até a ditadura acabar, que foi uma musica que eu fiz com Geraldo Vandré, a Canção da Despedida, foi muito censurada, insistimos, cheguei a colocá-la muitas vezes com nomes diferentes, mas não passava não!

Geraldo Vandré, todavia, numa entrevista a Ricardo Anísio em 2004, afirmou: 

“RA – Mas o Geraldo Azevedo também tem uma estória. Você disse que ele nunca foi seu parceiro em “Canção da Despedida”. Confirma isso?

GV – Claro que confirmo. Eu nunca tive parceiro nessa canção, a escrevi sozinho e ela está gravada no disco que fiz na França (“Das Terras de Bemvirá) mas quando foi lançado no Brasil veio sem essa faixa, não sei porquê, se foi por censura ou algo que o valha. A verdade é que depois que a marca Vandré virou um mito monstruoso apareceram parcerias que eu nunca fiz”.

Canção da Despedida - Geraldo Vandré (Compositores: Geraldo Vandré e Geraldo  Azevedo) | Geraldo azevedo, Letras de musicas, Musicas trechos de

O fato é que em 16 de julho de 1973 Vandré retornara ao Brasil. Ficara incomunicável nos quartéis do exército. Ao sair, disse que sua canção teria sido injustamente apropriada por grupos políticos e que dali para a frente só faria canções de ‘amor e paz’.

O artista Geraldo Vandré “morreu” ao voltar do exílio, restando apenas o advogado Geraldo Pedrosa de Araújo Dias. A ponto de que, quando Elba Ramalho foi gravar a “Canção da Despedida”, após sua liberação pela censura no fim da década de 70, Vandré não quis autorizar a sua execução, só o fazendo quando seu nome foi retirado dos créditos.

 Mas parece que era realmente uma despedida. Geraldo vandré nunca mais retornou… Ele jamais gravara esta canção. 

Canção da despedida – segunda do disco 2. Créditos Geraldo Azevedo/Geraldo

Geraldo Azevedo conta que, com a abertura política, disse que a “Canção da Despedida”, seguidamente censurada, poderia ser gravada. Aí ele procurou Vandré. Nas palavras de Geraldo Azevedo:

Minha conversa com Vandré foi difícil; ele não queria que a música não fosse gravada. resolvi que seria. Elba registrou-a em um belo disco, em 1980. (Só que, nos créditos, apareceram como autores Geraldo Azevedo e Geraldo – sem o sobrenome). Em 1985, Geraldo Azevedo colocou a autoria completa, pois soube que Geraldo Vandré se incomodara por não ter seu nome registrado integralmente.

Fontes: Silveira, Dalva, Geraldo Vandré: A vida não se resume em festivais (FT Editora)

http://www.abarriguda.org.br/destaques/entrevista-com-geraldo-azevedo/

https://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/19950805-37180-nac-0078-cd2-d4-not

“Por duas polegadas a mais…” A marchinha em homenagem a Martha Rocha

No último dia 4 de julho o Brasil perdeu Martha Rocha, a primeira Miss Brasil, em 1954, e que se tornou fruto, na época, de uma grande polêmica no concurso de Miss Universo daquele ano.

Martha Rocha ficou em segundo lugar no concurso, e se atribuiu, na época, que o motivo da americana Miriam Stenvenson ter ganho o troféu seria o fato de que Martha ter duas polegadas a mais de quadril.

Reportagem de O Globo em julho de 1954

A versão se tornou mais divertida que os fatos, terminou por ser fruto de uma onda nacionalista que valorizava os quadris da mulher brasileira.  

Por duas polegadas”, Martha Rocha perde o Miss Universo ...

Quem inventou a história foi o jornalista João Martins, da revista O Cruzeiro, do Rio de Janeiro,[7] para consolar o orgulho brasileiro. Tudo foi combinado com os demais jornalistas brasileiros que estavam em Long beach, onde se realizava o concurso A própria Martha autorizou a versão, conforme consta em sua autobiografia (Martha Rocha, Uma Biografia em depoimento a Isa Pessoa, Objetiva, 1993). “Nos Estados Unidos, nunca ninguém me tirou as medidas”, disse ela.

Outra especulação é que haveria a necessidade de que uma americana ganhasse, pois o Miss Universo estaria perdendo audiência nos Estados Unidos. Mas nada ficou provado.

A polêmica fez bem a Martha. Ela passou a ser cultuada no Brasil, passou a ser capa de revista, virou receita de bolo e passou a fazer campanhas publicitárias.

E isso virou marchinha de carnaval. Isso inspirou canções em homenagem ao episódio.  A marchinha “Duas Polegadas”, de Pedro Caetano, Alcyr Pires Vermelho e Carlos Renato, exaltou a beleza da baiana e as controvertidas duas polegadas a mais de quadril.

Há 65 anos, falsa versão tentava explicar a derrota de Martha ...
Miriam Stevenson e Martha Rocha

A letra da música fazia referência ao violão: : “Por duas polegadas a mais, passaram a baiana pra trás/Por duas polegadas, e logo nos quadris/Tem dó, tem dó, seu juiz!”. Martha, Martha, não ligue mais pra isso, não/ Martha, Martha, ninguém tem o seu violão.

Fontes;

http://www.missnews.com.br/historia/ha-65-anos-falsa-versao-tentava-explicar-a-derrota-de-martha-rocha-no-miss-universo

https://brasil.elpais.com/cultura/2020-07-05/morre-martha-rocha-a-primeira-miss-brasil.html

https://jacarezinho.portaldacidade.com/noticias/cidade/o-dia-em-que-a-primeira-e-mais-conhecida-miss-brasil-visitou-jacarezinho-5934

Martha Rocha, uma Biografia. Depoimentoa Isa

https://pt.wikipedia.org/wiki/Martha_Rocha

“Eu me amo”. Blitz e Ultraje a Rigor, ao mesmo tempo. Plágio?

No ano de 1984, a Blitz lançou uma música chamada “Egotrip”, praticamente ao mesmo tempo em que a banda Ultraje a Rigor lançava a música “Eu me amo”. Na época, a Blitz estava no auge, lançando seu terceiro disco, e o Ultraje a Rigor estava começando sua trajetória. Ambos tinham refrões quase iguais.

Em “Egotrip”, era: Eu me amo/eu me adoro/eu não consigo viver sem mim”

Em “Eu me amo”, era: “Eu me amo/Eu me amo/não posso mais viver sem mim”

Como o Ultraje lançou a música primeiro, Evandro Mesquita, vocalista da Blitz, foi acusado de plágio. Justificou então numa entrevista ao Jornal da Manhã, em 1984:

“Foi coincidência mesmo, essa nem Freud explica: Esse texto eu já utilizava há dois anos numa peça, ‘A incrível história de Nemias Demutcha’. Depois, resolvemos incluir na letra da música. Acredito que o pessoal do Ultraje, gente fina, tenha feito a música deles com praticamente o mesmo refrão na base do acaso. Mas como gravaram primeiro – e nós fomos avisados que o disco deles estava saindo – , resolvemos mudar o refrão. Ficou ainda melhor”  

Blitz 3 Egotrip 1984 Lp Em Estado De Novo - R$ 150,00 em Mercado Livre

Na verdade, o refrão ficou: Eu te amo/eu me adoro/eu não consigo te ver sem mim

Perdeu um pouco o sentido. Na verdade, Roger disse, numa entrevista reproduzida no livro “As Aventuras da Blitz” (Rodrigo Rodrigues, Ediouro, 2009), que a polêmica foi boa para o Ultraje, pois a Blitz era um sucesso e o Ultraje estava sendo conhecido. Houve uma provocação daqui ou dali da imprensa, mas o fato não foi muito adiante.

Rebelde Sem Causa Compacto Ultraje A Rigor Eu Me Amo - Música ...

Andrea Ascenção conta, no livro “Ultraje a Rigor” (Belas Letras), conta que na época da composição  Roger (vocalista ) estava lendo um livro que poderria hoje ser chamado de autoajuda. Ele pensava em fazer algo na linha de “Inútil”, primeiro sucesso da banda.

Eu me amo nasce quando Roger está lendo Solidão ou Medo do Amor (Ira Tanner),  é um livro de psicologia, que aborda análise transacional. Era uma coisa que estava na moda na época, foi um pouco antes dos livros de autoajuda.
O livro foi um achado na casa de um amigo no Rio de Janeiro, durante as férias. Roger utiliza a tese do livro que defende que as músicas de amor são sempre autodepreciativas e compõe justamente aquilo que não existe de acordo com o autor.
− Tudo bem, eu tenho um pouco de narcisismo, mas o lance da música não é esse. (…) Há uma ligação da letra de Eu me amo com a de Inútil, porque o lance de Inútil é dizer que a gente não é inútil… O livro dizia que, na criança, é natural isso de se amar, de, por exemplo, não emprestar seus brinquedos. E essas  músicas do tipo “não posso viver sem você”, “sem você a vida não vale nada”, são uma mentira. O bom mesmo é gostar de você mesmo. Partindo dessa ideia, tirei um sarro em cima desses clichês.